A matriz energética brasileira é limpa e conectada à transformação de valores do mundo. Falta transformar esse potencial em benefício aos consumidores e em uma vantagem competitiva às empresas. Essa é a proposta do novo marco regulatório do setor elétrico, cuja aprovação deve ser um tema prioritário na retomada dos trabalhos no Congresso.
Poucos países no mundo possuem um potencial tão favorável à produção de energia limpa como o Brasil. Água, etanol e biomassa, vento, sol: o Brasil dispõe de tudo isso em abundância, algo de causar inveja às nações que se esforçam para se adequar à necessidade de fazer a transição para uma economia de baixo carbono.
No aspecto energético, a economia brasileira possui uma grande vantagem comparativa no cenário global. Há grande oferta de energia limpa e barata. Não obstante, os brasileiros pagam uma das contas de luz mais caras do mundo. Ruim para o bolso das famílias, péssimo para o comércio e para a indústria. O custo da eletricidade, no lugar de ser um fator de competitividade, tem sido um peso adicional na estrutura de custos das empresas brasileiras.
É preciso transformar a vantagem comparativa da energia limpa e barata em uma vantagem competitiva de fato. O caminho para isso é derrubar as barreiras para os investimentos privados, aumentar a competição no mercado energético e incentivar o uso de fontes renováveis. Esses são alguns dos objetivos do Projeto de Lei do Senado (PLS) 232/2016, mais conhecido como Novo Marco Regulatório do Setor Elétrico.
O texto passou no Senado e agora está na Câmara aguardando a sua apreciação. Trata-se de um dos projetos tidos como prioritários pelo movimento cívico Unidos Pelo Brasil.
Portabilidade da conta de luz
A grande novidade do projeto será a portabilidade do serviço de energia elétrica, da mesma maneira que já ocorre há algum tempo com a telefonia e a internet. As pessoas poderão escolher os seus fornecedores, levando em consideração o preço cobrado, a qualidade do atendimento e também a fonte de energia – por exemplo, será possível optar por uma empresa que trabalhe exclusivamente como fontes renováveis.
Atualmente, a portabilidade é possível apenas para os grandes consumidores industriais e comerciais. São consumidores com acesso ao chamado mercado livre, onde impera a livre competição entre geradoras, comercializadoras e consumidores. Esse mercado dá uma pista da vantagem que poderá chegar a todos os brasileiros em breve: as empresas que compram eletricidade no mercado livre pagam, em média, 20% menos do que aquelas que estão no mercado cativo.
Atualmente existem mais de 180 mil consumidores de alta tensão, mas, por questões regulatórias, apenas 12.000 deles podem acessar o mercado livre. O novo marco vai abrir esse sistema de contração para todos os consumidores com carga superior a 3.000 kilowatts (kW), sejam eles empresariais ou residenciais. Hoje apenas as grandes empresas, cujas tarifas ultrapassem R$ 80.000, contam com essa possibilidade.
Além disso, os pequenos produtores que possuam sobra de energia poderão também vendê-la. É o caso, por exemplo, de residências ou propriedades rurais com placas fotovoltaicas para consumo cuja geração supera as suas necessidades.
A nova lei também vai eliminar alguns subsídios setoriais que hoje oneram a conta de luz. Apenas em 2020, estima-se que a arrecadação adicional destina a esses subsídios vai custar R$ 22 bilhões ao bolso dos brasileiros.
A vantagem brasileira
A análise da matriz das fontes de energia elétrica brasileira na comparação com o resto do mundo demonstra a situação particular do país: mais de 80% da eletricidade consumida no país provém de fontes renováveis, enquanto na média mundial o percentual fica ao redor de 20%.
Essa superioridade brasileira deve-se tudo à geração hidráulica. Mas estão ganhando importância outras fontes renováveis, como a eólica, a biomassa e, mais recentemente, a solar.
O Brasil, nesse aspecto, aparece na vanguarda mundial da descarbonização. Ocupa um posto em que muitos países gostariam de estar. Mas uma regulamentação ultrapassada e desconectada com as novas possibilidades do mercado de energia está restringindo o desenvolvimento desse mercado no país.
Há boas notícias: a produção de fontes alternativas, como a eólica, tem avançado; e a fonte solar, graças ao barateamento e maior eficiência das placas, ganha força na micro e na minigeração energética.
As tendências favoráveis precisam ser impulsionadas para que esse potencial se transforme em benefício para os consumidores e em uma vantagem competitiva para as empresas. O novo marco regulatório conecta o país com as transformações que ocorrem em todo o mundo, traz mais competição para o setor e incentiva os investimentos. A sua aprovação deve ser um tema prioritário na retomada dos trabalhos no Congresso.