Para Edmar Bacha, a abertura econômica deve ser estruturada no tripé: redução do custo Brasil, troca de tarifas por câmbio e estratégias para acordos comerciais.
Vencida a primeira etapa da votação da Reforma da Previdência, e com a discussão da Reforma Tributária em andamento no Congresso Nacional, o Brasil inicia agora o debate sobre como promover crescimento e desenvolvimento no médio e longo prazo. Embora existam diferenças sobre o ritmo a ser adotado, há um relativo consenso entre especialistas de uma agenda que se tornou mais que urgente: a abertura econômica do país. O Brasil tem um dos indicadores mais baixos de abertura comercial do mundo, com exportações mais importações representando 24,6% PIB em 2016, dado mais recente, enquanto a média global gira em torno de 51,3%.
“O país é uma das economias mais fechadas do mundo. Temos 3% do PIB mundial, mas apenas 1% das exportações mundiais: um gigantinho em termos de PIB, um anão em termos de exportações.” Edmar Bacha
Para se ter uma ideia. O nível de abertura comercial do Chile supera em mais de duas vezes o do Brasil. Esse indicador demonstra como estamos mal na fotografia. Barreiras às importações, na avaliação de especialistas, produzem queda de produtividade e do bem-estar. Não à toa, países mais fechados ao comércio apresentam PIB com ritmo mais lento de crescimento. Por outro lado, registram inflação, desemprego e pobreza mais altos. A abertura comercial é capaz de dinamizar a economia em pelo menos três frentes, segundo o Banco Mundial.
A abertura comercial pode dinamizar a economia em três frentes
Primeiro em relação à produtividade. A concorrência leva as empresas a inovarem e produzirem com mais eficiência, aumentando a produção. Ou seja, a abertura comercial promove a produtividade ao incentivar as empresas a experimentar e adotar novas tecnologias, e ao realocar recursos para as empresas mais eficientes.
O segundo ganho é com relação ao que é classificado de “acessibilidade financeira”. A concorrência reduz os preços para o consumidor. O terceiro ganho é relativa à integridade. A disputa entre as empresas leva a investirem recursos para atrair consumidores, e não privilégios do governo.
Mas desde os anos 90 o Brasil tem adotado ou evitado medidas que estimulem esses ganhos. A política de proteção comercial, por meio de barreiras tarifárias e não tarifárias, explica a baixa integração global do Brasil. Segundo o último relatório do Banco Mundial, publicado no ano passado, “a alíquota tarifária praticada pelo Brasil em 2015 foi de 8,3%, em média – a mais elevada entre as economias emergentes e avançadas”. Além das tarifas, as MNTs (medidas não-tarifárias) e os obstáculos processuais ao comércio também são generalizados, aumentando os custos de comércio.
O economista Edmar Bacha, que trabalhou na equipe que elaborou o Plano Real, tem defendido a urgência de uma política de abertura comercial para o Brasil, que considera a “mãe de todas as reformas”. Diretor do Instituto de Estudos em Política Econômica/Casa das Garças, no Rio de Janeiro, Bacha é favorável a uma “abertura soberana unilateral que traga as tarifas brasileiras para níveis médios internacionais num prazo de 4 anos”. O chamado “Plano Bacha” incluiria algumas medidas estruturais essenciais, entre as quais, a redução progressiva de tarifas de acordos comerciais do Brasil e a redução do custo Brasil. A meta seria duplicar a parcela do comércio internacional no PIB de 25% para 50% em dez anos.
Domesticamente, lidar com o custo Brasil. Externamente, reduzir progressivamente a tarifa externa comum do Mercosul e promover outros acordos comerciais à semelhança do recentemente concluído entre o Mercosul e a União Europeia.
Abertura comercial costuma gerar resistências por parte da indústria local, mas Bacha considera que o ganho está, justamente, na possibilidade de as empresas se reinventarem para enfrentar a concorrência, promovendo maior produtividade. O sistema empresarial, industrial e de serviços, com exceção da agricultura e mineração, é fortemente voltados para o mercado interno, com um elevadíssima proteção contra os importados. Ou seja, contra a renovação tecnológica, sem a qual não há ganho de produtividade.
A preocupação com o volume de importações, numa eventual abertura comercial, só faz sentido do ponto de vista de se evitar déficit comercial. Portanto, para Bacha, um processo de abertura de importação tem que ter incentivos adequados para as exportações, para não desequilibrar a balança de pagamentos. O lado positivo das importações é que, com elas, o Brasil adquire também novas tecnologias, que podem melhorar a nossa produtividade e, consequentemente, a qualidade dos produtos que também poderão competir no mercado internacional.
A indústria brasileira precisa ser reinventada para sobreviver. O caminho é indicado pela experiência da Embraer, Weg e outras empresas que se internacionalizaram. Edmar Bacha
Entenda o Plano Bacha de abertura econômica
O estudo de Edmar Bacha de abertura econômica teria um tripé, a serem implantados de forma gradual e simultânea: redução do “custo Brasil”; troca de tarifas por câmbio; e acordos comerciais.
Redução do Custo Brasil
Redução do custo Brasil envolveria três conjuntos de ações:
1) Reforma fiscal, com simplificação do sistema de taxação indireta (idealmente com a criação de um Imposto sobre o Valor Adicionado nacional simplificado, em substituição à complexidade dos atuais IPI, PIS/Cofins e ICMS), e uma Reforma da Previdência que valide a PEC do teto dos gastos sem prejuízo da educação e da saúde.
2) Reforma trabalhista que simultaneamente amplie a participação dos trabalhadores na gestão das empresas e, ali onde a representação sindical for suficientemente representativa, permita a prevalência das convenções coletivas sobre os ditames da CLT.
3) Uma significativa melhoria na infraestrutura, com a agilização das concessões em energia, rodovias, ferrovias, portos e aeroportos.
Troca de tarifas por câmbio
A troca de tarifas por câmbio significa uma mudança na política de proteção às atividades nacionais, que deixaria de depender como agora de tarifas elevadas às importações e outros mecanismos discriminatórios (como preferências elevadas para compras governamentais; requisitos altamente complexos de conteúdo nacional; subsídios creditícios indiscriminados do BNDES), para se beneficiar de uma taxa de câmbio mais competitiva. Nesse item, estariam incluídas medidas de facilitação do comércio tais como acelerar a alfândega e agilizar os portos.
Nova estratégia de acordos comerciais
O terceiro componente da nova estratégia seriam os acordos comerciais, em relação aos quais o país já chega com grande atraso em relação a nossos vizinhos latino-americanos do lado do oceano Pacífico. Ações de relevância seriam: dar curso aos compromissos assumidos no Acordo de Facilitação do Comércio da Organização Mundial do Comércio; concluir a negociação entre o Mercosul e a União Europeia que se arrasta há anos; e abrir novas frentes de negociação de acordos comerciais com nossos principais parceiros, como Japão, Reino Unido e Estados Unidos. Nesse país, sob Trump, está no momento prevalecendo uma mentalidade protecionista.