A permanente campanha eleitoral em que vive o governo ameaça paralisar a pauta das reformas no Congresso e a retomada do crescimento econômico sustentável.
As pessoas se perguntam se é mesmo real ou apenas uma sensação o clima de campanha eleitoral permanente que vivemos. Mal terminou a cerimônia de posse do presidente Bolsonaro em janeiro e já se iniciou no Brasil a temporada de especulações sobre sua sucessão em 2022. As primeiras ações do presidente deram ainda maior força a esse movimento de antecipação do debate eleitoral. A resposta, portanto, é sim.
O palanque diário
A campanha permanente é uma característica dos regimes populistas. Não apenas no Brasil. Os governantes que tentam manter uma relação direta com as ruas físicas e digitais tendem a diminuir e, em alguns casos extremos, a suprimir o papel das instituições representativas. Eles fazem política com alto teor emocional e de apelo imediato ao eleitorado. Agem como se a votação para decidir sua sucessão fosse sempre no dia seguinte.
Agindo assim, os governantes comprimem os ciclos eleitorais convencionais, com duração de quatro anos no caso de eleição presidencial, em jatos diários de efusão emotiva derramados como se estivessem todos os dias no palanque. Com ajuda de seus gurus de redes sociais –que medem, mas também aumentam o pulso dos influenciadores digitais — eles governam criando a todo momento factoides, escândalos e falsas crises.
Alguém se lembrou de Donald Trump ou do inglês Boris Johnson? O padrão é o mesmo. Bolsonaro emula o colega americano, correndo, é claro, o risco de aqui a mágica não funcionar, pois, ao contrário dos Estados Unidos, governa um Brasil com altas taxas de desemprego e uma economia que teima em não crescer. Esse é o perigo que corremos em 2020.
A ameaça da corrida pelo voto para o crescimento econômico
A eleição municipal ameaça paralisar a pauta das reformas no Congresso e a retomada do crescimento econômico sustentável. Será preciso liderança e destreza na articulação política – duas virtudes inexistentes até o momento no governo – para debater as reformas administrativa e tributária. Será difícil discutir a revisão de carreira dos servidores, instituir avaliação de desempenho ou discutir a estabilidade do funcionalismo público num ano em que os parlamentares estarão envolvidos nas campanhas municipais. Da mesma forma, não será fácil debater os critérios de redistribuição dos impostos entre União estados e municípios e relembrar o eleitor que os impostos não vão diminuir no curto prazo.
Na corrida pelo voto, entram as preocupações com os índices de aprovação e as políticas que precisam gerar percepção positiva. E a única coisa que pode trazer uma brisa de esperança e de ânimo é a retomada do crescimento econômico e do emprego. Se os sinais da retomada não começarem a surgir no horizonte de 2020, as vozes contrárias à política liberal de Paulo Guedes começarão a ganhar o ouvido do presidente Bolsonaro com os tradicionais cantos da sereia do intervencionismo econômico, do crédito subsidiado e de programas populistas. O torpor momentâneo pode ajudar nos votos, mas as consequências serão desastrosas para o país que está se esforçando para superar a pior recessão da sua história – fruto do populismo econômico dos governos petistas.
Desde que assumiu, o presidente Bolsonaro viu seus índices de aprovação caírem, ampliando a pressão sobre o seu time de Governo. Embora tenha conseguido encaminhar a aprovação da Reforma da Previdência e publicado a Medida Provisória da Liberdade Econômica, os índices da economia ainda patinam. Alto desemprego e baixo crescimento dificultam o discurso de cabo eleitoral em 2020 ou mesmo da reeleição em 2022. Os candidatos do PSL serão cobrados pelo desempenho do Governo Bolsonaro na campanha do próximo ano, e essa cobrança tende a aumentar à medida que o presidente se envolver mais diretamente nas disputas locais.
Políticas de curtíssimo prazo ou enfrentamento do desgaste
A equação que está sobre a mesa, portanto, sugere dois caminhos no plano nacional. Com o calendário de 2020 já batendo à porta, e um cenário em que a comunicação instantânea amplia a pressão por respostas rápidas, o presidente pode recorrer a políticas de curtíssimo prazo na área econômica para melhorar seus índices avaliação, tornando-se um ator importante na articulação das disputas do próximo ano, e um candidato viável em 2022. Os efeitos negativos no médio prazo, contudo, poderão surgir em 2022. O segundo caminho é o presidente enfrentar o desgaste, isto é, evitar que o populismo econômico deteriore ainda mais a economia. Com isso, estaria de algum modo dificultando o caminho para que o PSL se nacionalize em 2020. A opção de evitar o populismo econômico, embora com evidentes custos eleitorais, pode, por outro lado, ajudar no processo de reformas e estruturação do crescimento mais de médio e longo prazo. A questão é como Bolsonaro vai lidar com esse cenário, em que lideranças políticas relevantes no quadro nacional, não só o presidente, participam cotidianamente da campanha permanente pelas redes sociais.
O que se sabe é que o palanque diário afeta para pior uma das qualidades centrais da democracia, que é a possibilidade de os eleitores premiarem seus representantes com a recondução ao cargo ou puni-los, evitando que permaneçam no poder. Nesse modelo, quem mais perde é o estadista, definido como o governante que pensa não na próxima eleição, mas na próxima geração. Obviamente, ciclos eleitorais mais espremidos em um contexto de baixo crescimento econômico são um estímulo a tomada de decisões com políticas de curto prazo, que visem gerar efeitos positivos imediatos, mas que não contribuem para o desenvolvimento sustentável do país.