Ficaram fora do discurso temas caros à abertura e crescimento econômico do Brasil, como o compromisso do governo com a agenda das reformas e a segurança jurídica.
No seu discurso na ONU Bolsonaro perdeu a chance de demonstrar para um mundo afogado em liquidez financeira e asfixiado por taxas de juros negativas que o Brasil sob seu comando é o destino mais confiável para os investidores.
Não houve compromisso com as reformas e clareza sobre política ambiental
O presidente brasileiro falou muito por alto em privatizações, diminuição do Estado e abertura econômica, mas não disse uma única palavra sobre o compromisso do governo com a agenda das reformas e a sua importância para melhorar a segurança jurídica no País. Desperdiçou a chance de mostrar clareza que não deixará pairar dúvidas sobre seu compromisso com o meio-ambiente e, assim, aplacar a sanha punitiva que se levanta contra as exportações brasileiras em nossos melhores mercados. Ressaltou o acordo Mercosul-UE e Mercosul-EFTA como vitórias de sua política comercial sem viés ideológico. É certo que mencionou seu contentamento com a possibilidade real do Brasil integrar a OCDE e, portanto, ter que adotar as melhores práticas de proteção ambiental exigidas de seus membros. Mas foi pouco, no momento em que o tratado Mercosul-União Europeia ainda precisa ser ratificado. O foco deveria ter sido na reaproximação amigável, mas Bolsonaro se preocupou mais em dar respostas cifradas aos líderes europeus que o atacaram.
O francês Emmanuel Macron não teve seu nome citado por Bolsonaro, mesmo sendo alvo óbvio das críticas do brasileiro. Momentos mais tarde, Macron devolveu a indelicadeza. Não citou Bolsonaro nem o Brasil, mas defendeu o boicote a países que desmatam. Foi eficiente lembrar que um dos pilares sobre os quais a ONU se apoia é a luta pela descolonização, colocando o Brasil como alvo dos “neocolonialistas” europeus. Mas sucesso mesmo seria Bolsonaro ter saído da ONU nas boas graças de Macron. Sucesso seria ter tirado dos franceses o pretexto político que eles esperavam para posarem de bonzinhos e defensores do meio ambiente, quando na verdade querem mesmo é proteger os agricultores franceses e manter as reservas de mercado agrícola na Europa.
Não existe santo na política externa, mas surgem sempre alguns tolos ocasionais que, para fazer farol com suas claques radicais em casa, posam de perfeito vilão global. O estadista mais detestado e menosprezado pela comunidade internacional foi o figurino que os adversários do Brasil encomendaram para Bolsonaro — e que ele teve a chance de desvestir na ONU e não o fez. Bolsonaro tentou dar maior abrangência a sua política externa e objetivos comerciais falando de suas próximas viagens à China, ao Japão e aos países árabes. Mas, afagos mesmo, só fez aos Estados Unidos e a Israel. Não existe cenário pior para externar essas simpatias unilaterais do que diante da Assembleia Geral das Nações Unidas. Em seu atual mandato, o presidente brasileiro terá ainda três novas oportunidades de ocupar o mesmo e privilegiado púlpito. Nas próximas vezes, esperamos que ele se preocupe menos em acertar as pontas com desafetos reais e imaginários e foque em demonstrar que o Brasil merece não apenas a simpatia, mas os investimentos do mundo.