Indicadores acima do previsto não representam a volta do crescimento duradouro e é ilusório imaginar que os problemas estruturais ficaram para trás. Melhora nas contas públicas é reflexo da inflação, que transfere dinheiro das famílias para o bolso do governo. PIB per capita deve voltar ao nível pré-pandemia apenas em 2023.
A economia brasileira cresceu um pouco acima do esperado no início do ano. O avanço do produto interno bruto (PIB) no primeiro trimestre foi de 1,2% na comparação com o último trimestre de 2020. Com o resultado, o volume total de produtos e serviços produzidos pela economia brasileira voltou ao patamar do final de 2019 – ou seja, ao nível pré-pandemia. Os consultores estão revisando as suas projeções e o resultado final de 2021 deverá superar as expectativas iniciais.
Trata-se sem dúvida de números positivos e distantes do cenário mais negativo vislumbrado poucos meses atrás. Há outros indicadores de melhora na economia também, entre eles o aumento na arrecadação de tributos e o recorde na Bolsa de São Paulo.
Os bons indicadores, contudo, são um falso positivo. O País vive uma recuperação cíclica, natural depois do choque inicial provocado pelo fechamento da economia em decorrência do coronavírus. Contribuem, é verdade, os juros baixos, algo que favorece, por exemplo, o setor imobiliário, um dos principais responsáveis pela retomada. O agronegócio e a mineração também exibem um ritmo de crescimento expressivo, embalados pela alta na demanda internacional.
Esses indicadores favoráveis não podem ser confundidos com crescimento sustentado e duradouro de longo prazo.
Um primeiro ponto a ser observado é que a pandemia não foi embora. O Brasil permanece atrasado na vacinação. Os setores com restrições para operar normalmente, como o comércio e as atividades de lazer, continuam amargando contrações na atividade. Eles são grandes empregadores de mão de obra de baixa qualificação. A indústria enfrenta dificuldades para obter insumos. Até que não exista uma grande parcela da população imunizada, dificilmente ocorrerá uma retomada sólida dos investimentos produtivos e das contratações.
As famílias e as empresas sentem ainda os efeitos da alta na inflação, um reflexo dos desequilíbrios causados pela pandemia e, sobretudo, da valorização do dólar. Preço nas alturas engorda o lucros de alguns poucos, mas a maioria sai perdendo.
O Brasil, não se pode esquecer, nunca registrou um número tão grande de desempregados: há 15 milhões trabalhadores em busca de uma vaga e, considerando-se a subocupação, são mais de 30 milhões de pessoas que ou não tem trabalho ou estão trabalhando menos do que poderiam. Trata-se de uma conjuntura totalmente diferente da vista nos EUA, onde a vacinação está avançada, a economia volta à normalidade e a taxa de desemprego é de 6%, enquanto no Brasil ela está ao redor de 15%.
A melhora nas finanças públicas é também ilusória em grande medida. A inflação elevada aumenta artificialmente as receitas do governo, ao passo que reduz o peso relativo das suas despesas. Em resumo: é uma transferência de riqueza do setor privado para os caixas governamentais. Como alerta um relatório da XP, a inflação ajuda o governo no curto prazo, mas pressiona no futuro os gastos indexados. Afirmam os economistas Caio Megale e Rachel de Sá: “O risco ‘crônico’ fiscal, caracterizado pela dívida elevada, juros reais altos e orçamento engessado com mais de 90% de despesas primárias obrigatórias, persiste. Mesmo com a melhora nas projeções para este ano, a dívida brasileira segue significativamente acima da média das outras economias emergentes”.
O veranico dos bons indicadores econômicos não podem turvar as análises e encobrir a realidade de que há economia brasileira cresce há quatro décadas abaixo da média internacional. A produtividade permanece estagnada. Enquanto a Coreia do Sul teve um avanço de 408% desde 1980, no Brasil a produtividade não avançou praticamente nada, com alta de apenas 5%. Os números foram publicados nas redes sociais por João Amoêdo.
O economista Aod Cunha, em um artigo recente, mostrou que a produtividade brasileira terá que triplicar nos próximos anos para que o país consiga manter uma taxa de crescimento de 2% ao ano na próxima década. Isso porque não haverá mais a ajuda do bônus demográfico. Daqui para a frente, mesmo para avançar a um ritmo pífio de 2%, o País dependerá de ganhos de produtividade, e isso só é possível com mão de obra mais qualificada e mais investimentos em tecnologia e infraestrutura. Em resumo, será necessário um conjunto amplo de reformas para ampliar a produtividade no setor público e no setor privado, como defende o movimento Unidos pelo Brasil.
O PIB falso positivo pode criar a sensação de que os problemas imediatos ficaram para trás e incitar a procrastinação das reformas. Seria a receita para o fracasso.