Governos que tomam medidas extremas para salvar vidas durante a pandemia não podem mais ignorar as milhões de mortes e o impacto socioeconômico causados por doenças relacionadas à poluição do ar no meio ambiente. Eliminar as emissões de partículas poluentes dos veículos de combustão interna, por exemplo, trará enormes benefícios para a sociedade: vai melhorar drasticamente a saúde de todos e impulsionar a economia.
Por Lucas di Grassi, piloto
Da mesma forma que a maior parte das atividades no mundo, o esporte a motor está paralisado devido à pandemia do Sars-Cov-2. Neste hiato, fiz algumas pesquisas sobre o coronavírus e descobri vários artigos técnicos citando a correlação entre o alto nível de poluição do ar e as infeções virais respiratória. Fiquei convencido que a poluição do ar contribui para o efeito devastador de várias enfermidades virais respiratórias, incluindo a Covid-19.
De acordo com os pesquisadores Jonathan Ciencewicki e Ilona Jaspers no ar no artigo ‘Air Pollution and Respiratory Viral Infection’ (2007), há clara ligação entre os poluentes e o crescimento do contágio e infecção por mais de 200 tipos de vírus, incluindo o coronavírus.
Doenças respiratórias também têm efeito devastador na economia. De acordo com o artigo acima, a maior parte das horas de trabalho desperdiçadas nos Estados Unidos estão relacionadas de alguma forma a doenças do trato respiratório.
A poluição do ar nas grandes cidades
Cerca de 65% da população mundial vive em cidades, nas quais os gases emitidos por motores de combustão interna de carros e caminhões contribuem imensamente para a poluição do ar. Apesar de ser difícil calcular uma média mundial, as emissões do tráfego prejudicam o ar de todo o planeta.
De uma forma geral, pode-se contar seis principais subprodutos dessas emissões: monóxido de carbono, óxido nitroso, chumbo, compostos orgânicos voláteis, matéria particulada 2.5 e dióxido de enxofre. Todos esses compostos, apesar de variarem bastante nos diferentes tipos de motores e combustíveis, são encontrados nos gases que saem dos escapamentos, e contribuem para a poluição onde veículos e pessoas coexistem.
Doenças decorrentes da poluição do ar
A correlação é evidente. Não há escassez de artigos que relacionam a poluição do ar e diversas doenças, incluindo todas as moléstias respiratórias, além de males cardiovasculares e câncer.
Em 2016, A Organização Mundial da Saúde estimou que 4,2 milhões de mortes foram causadas pela má qualidade do ar do meio ambiente.
Em termos humanos e econômicos é imensa a perda gerada pela soma total dos gastos públicos com saúde para tentar tratar estas doenças – a começar pelas prematuras perdas de vidas. Seus efeitos se fazem sentir negativamente também na diminuição da capacidade de produção no trabalho. O planeta está tendo uma amostra disso quando tenta combater a atual pandemia.
O que se abate sobre o mundo agora é uma segunda pandemia, a do vírus, que se soma à outra, silenciosa, invisível e permanente, a da poluição do ar. Espero que o alarme momentâneo soado pelo coronavírus possa, finalmente, acordar o público, os políticos e as empresas em geral para o risco que a má qualidade do ar representa.
Mobilidade elétrica: uma solução
Uma solução para o problema é a mobilidade elétrica. Veículos elétricos produzem poluição zero no local onde são utilizados. Os volumes totais de gases de efeito estufa gerados em todo o ciclo de fabricação dos carros elétricos e de seu combustível, a eletricidade, variam bastante – mas não se podem comparar com os dos carros com motores de combustão interna.
O tipo de fonte de geração de energia elétrica de cada país é crucial. Um país que ainda gere 100% de sua energia elétrica por meio de usinas térmicas a carvão ou óleo tem menos a lucrar em transformar sua frota de carros e caminhões em veículos elétricos do que um país, como o Brasil, cuja matriz energética é quase toda de origem limpa, predominantemente hidrelétricas. Essas variações, no entanto, não invalidam a conclusão de que os motores de combustão interna são incompatíveis com níveis saudáveis de qualidade do ar.
Zerar as emissões dos veículos vai mudar drasticamente a qualidade do ar nas cidades e melhorar a saúde de todos, salvando vidas e impulsionando a economia. Para acelerar a transição entre as duas tecnologias, é necessário que o subsídio ou taxação de impostos leve em consideração o benefício total que seria gerado para a sociedade. Especialmente nas cidades, os carros e vans elétricos devem ser a regra em um mundo pós-coronavírus.
Os governos que tomam agora medidas extremas para salvar vidas durante a pandemia não podem mais ignorar os milhões de mortes e o impacto socioeconômico de não tomar medidas para minimizar a poluição do ar. Tempos difíceis levam a mudanças importantes. Realmente espero que esse seja o caso agora.