A ilusão de alguns de que um governo populista e irresponsável, desde que à direita do espectro político, seria inofensivo para os mercados vai ficando para trás. Não há como haver prosperidade sem investimentos, e os investimentos só prosperam quando há estabilidade política e econômica
Nas eleições de 2014, os mercados financeiros oscilavam como uma gangorra: quando Dilma Rousseff subia nas pesquisas, a bolsa de São Paulo caía, e vice-versa. No cálculo desapaixonado dos investidores, a reeleição de Dilma seria negativa para as perspectivas de negócios e de crescimento econômico. Lucros menores significam bolsa em queda.
Até recentemente, a bolsa de São Paulo parecia dar de ombros para as imposturas diárias do presidente Jair Bolsonaro. Reinava o cálculo cínico segundo o qual enquanto a economia estivesse razoavelmente no rumo correto pouco importava os ataques às instituições democráticas. As ameaças eram consideradas, ao menos por parte dos agentes financeiros, como bravatas estéreis.
A ilusão de que um governo populista e irresponsável, desde que à direita do espectro político, seria inofensivo para os mercados vai ficando para trás. Bolsonaro responde a cada crise institucional como uma nova crise ainda maior, causando turbulência política e desviando o País das suas reais prioridades de longo prazo.
Bolsonaro é hoje um presidente sitiado em seu Palácio. Investigado por corrupção na CPI da pandemia, investigado por prevaricação pela Procuradoria-Geral da República, investigado pelo Tribunal de Contas da União pelo uso indevido de recursos públicos. O presidente é ainda alvo de inquéritos no Supremo Tribunal Federal, além da notícia-crime apresentada pelo Tribunal Superior Eleitoral no caso das fake news.
A cada nova investigação, Bolsonaro responde com novos ataques às instituições democráticas. O maior exemplo recente é a sua campanha oportunista contra a confiabilidade do voto eletrônico.
É inocência imaginar que a incerteza política e a perspectiva de alto grau de turbulência até as eleições do próximo ano não tenham impacto sobre a economia. Os custos são enormes e vão ficando escancarados. Enfraquecido, resta a Bolsonaro comprar apoio político. Propostas como a do parcelamento do pagamento dos precatórios, entre outras medidas criativas, são maneiras de driblar o teto de gastos e abrir espaço no Orçamento para elevar os gastos no ano eleitoral.
“O país parece flertar perigosamente com o passado”, adverte a carta mensal do fundo Verde, sob o comando do gestor Luis Stuhlberger. “As seguidas discussões recentes sobre tirar gastos do teto, com vistas a operações de cunho eleitoral, sinalizam uma preocupante vontade de reviver de modo permanente o ‘acelerador fiscal’ no modelo macro brasileiro.” Os gestores afirmam que as incertezas tornam a administração de recursos “muito mais complexa”.
Não há como haver prosperidade sem investimentos, e os investimentos só prosperam quando há estabilidade política e econômica. Bolsonaro esmera-se em jogar contra em ambos os campos — se falar na sua atuação catastrófica na pandemia. As reformas estruturantes não avançam e, além disso, há retrocessos nos pilares macroeconômicos. A inflação se aproxima de 9% ano, os juros voltaram a subir, a dívida pública é a maior entre as nações emergentes. Nesse ambiente hostil, há pouca geração de empregos. São 15 milhões de trabalhadores desocupados. Pelas projeções atuais, apenas em 2025 a taxa de desempregados ficará abaixo dos dois dígitos.
Enquanto isso, Bolsonaro segue insuflando os seus seguidores mais fiéis pelas redes sociais ou em suas motociatas. A novidade agora foi a “tanqueata”, promovida ontem em Brasília, um desfile extemporâneo de tanques e blindados militares.
Em meio ao caos, o Centrão, base de apoio tão oportunista quando volátil de Bolsonaro, vai promovendo retrocessos na economia e na política. Tramam, por exemplo, para aprovação do distritão como novo sistema eleitoral, que, se aprovado, representará a ruína da representatividade política dos eleitores e dos partidos.
A insegurança política e a incerteza fiscal minam as perspectivas de retomada dos investimentos de longo prazo. O preço das ações passou a refletir isso. O índice S&P 500 com as maiores empresas dos Estados Unidos acumula uma valorização de quase 20% desde o início do ano. O Ibovespa, depois de uma sequência de altas até junho, entrou em queda e está praticamente do zero a zero desde o início do ano. O certo otimismo com a perspectiva de retomada pós-pandemia perdeu força. Dólar caro e juros em alta também pesam contra os investimentos. Bolsonaro, além de sabotar o seu próprio governo, vai sabotando o crescimento econômico e as perspectivas de negócios. É o que mostra a gangorra dos mercados.
E o que fazer, Eliseu?
Como mobilizar os 15 (ou 30) milhões de desempregados?
Que alianças fazer para sairmos dessa?
Abçs.