Mesmo com a economia frágil, o Banco Central terá que subir os juros para conter o ritmo dos reajustes de preços. Aperto financeiro é consequência da má gestão da pandemia e da falta de confiança no País
Apesar da recuperação ainda lenta na economia e do elevado nível de desemprego, o Banco Central deverá aumentar a taxa básica de juros, a Selic, em sua reunião de hoje. A expectativa é de uma alta de 4,25% para 5,25% ao ano. Novos aumentos provavelmente ocorrerão nos próximos meses, e estima-se que a Selic possa chegar a 8% até o fim do ano. A escalada dos juros será necessária para combater a inflação, que vem ganhando força e se mantém bem acima da meta oficial, que é de 3,75%.
A vacina amarga dos juros mais altos chegará ao Brasil antes do esperado e deverá conter esfriar a retomada nos setores mais dependentes de financiamento. Como resultado, o desemprego permanecerá em níveis recordes por mais tempo.
Esse é o custo do ambiente de insegurança e falta de senso de prioridades do governo de Jair Bolsonaro. Além de não aprovar as reformas necessárias para destravar os investimentos produtivos e a criação de emprego, o presidente dedica-se a atacar as instituições democráticas e a insuflar a polarização política. Bolsonaro, por fim, fez de tudo para sabotar o quanto pôde as medidas sanitárias para o combate da Covid-19, valendo-se de um cálculo oportunista de que assim evitaria uma recessão mais profunda. A consequência foi duplamente trágica, com a perda de milhares de vidas que poderiam ter sido evitadas e o aprofundamento da crise econômica.
Não haverá avanço sólido do PIB até que a pandemia esteja sob controle. Nesse ambiente inóspito, os empresários brasileiros e internacionais preferem recolher os seus projetos de longo prazo. O risco Brasil reflete-se na valorização do dólar. O aumento na cotação da moeda americana encarece produtos básicos, com reflexos sobre todos os preços. A inflação, que chegou a ficar abaixo de 2% no ano passado, agora roda acima de 8%. O impacto é maior para os mais pobres: houve forte aumento nos preços dos alimentos, do gás e da eletricidade. No caso da energia, os reajustes refletem a bandeira vermelha tarifária, em razão da falta de chuvas e risco mais elevado de racionamento. A alimentação em domicílio ficou 18% mais cara no último ano, e os brasileiros tiveram que se adaptar, como mostra a queda na venda de carne. O preço do botijão de gás passou dos R$ 100, forçando os mais pobres a recorrer à lenha para cozinhar.
O aumento no custo de vida pegou as famílias em uma situação econômica frágil. Existem quase 15 milhões de pessoas desempregadas (14,6% dos trabalhadores). O quadro só não é pior por causa de trabalhos informais e dos bicos, que ocupam hoje 4 em cada 10 brasileiros.
De acordo com uma pesquisa da Tendências Consultoria, as famílias vivem a situação financeira mais apertada desde 2005. Na média nacional, de cada R$ 100 da renda doméstica, sobram R$ 41 para consumir itens não essenciais, pagar dívidas e — se for possível — fazer uma pequena poupança. Na classe A, a folga no orçamento é de 51%. Nas classes D e E, de cada R$ 100 de salários sobram apenas R$ 21,60 para consumir.
Enquanto os brasileiros vão sendo castigados pelo “custo Bolsonaro”, a popularidade do presidente cai em queda livre. A sua cartada final para evitar uma derrota nas próximas eleições será encontrar maneiras de aumentar os gastos públicos. O governo, em negociações com o Centrão, vem buscando maneiras de driblar as restrições do teto de gastos para assim encontrar espaço no Orçamento para aumentar as despesas. A ideia que vem sendo ventilada é adiar parcialmente o pagamento de precatórios, uma despesa estimada em R$ 90 bilhões para o próximo ano. Será uma pedalada, mas, para não ferir a lei, o governo quer aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para, assim, não ser acusado de crime fiscal.
É o tipo de medida que serve apenas para erodir a confiança no País e prolongar a crise econômica. O “custo Bolsonaro” ainda pesará no bolso dos brasileiros por muitos anos.