Para que o crescimento do Brasil seja sustentável é preciso não se deixar por duas ilusões: a de que os efeitos positivos do início do ciclo de recuperação da nossa economia anuncia uma grande guinada, e a de que o otimismo com a retomada da economia vai impulsionar as reformas políticas.
O mercado financeiro vive de perspectivas. Por isso, o hábito permanente de se criar cenários político e econômico para definir as estratégias de investimento e as apostas nos ativos financeiros fazem parte do cotidiano do mercado. O problema está quando o “efeito manada” leva o mercado a perder o discernimento entre aposta e realidade. A ilusão criada sobre os efeitos positivos do crescimento econômico e sua capacidade de promover a “grande virada” do País é o mais recente fenômeno do “efeito manada”.
Efeito manada
Primeiro, vamos aos fatos. A economia iniciou um ciclo de recuperação cíclica. Se o crescimento da economia será de 2% ou 3% em 2020, depende de vários fatores. Mas o fato é que o Brasil vai crescer esse ano.
O aumento da oferta de crédito e a queda da taxa de juros ajudaram a impulsionar o consumo e a movimentar a atividade econômica. Isso é bom, mas não é suficiente para assegurar o crescimento sustentável. Até agora nada ou muito pouco foi feito para enfrentar os gargalos da baixa produtividade.
A reforma tributária não saiu do papel; a baixa qualidade educacional da nossa mão de obra é fruto de um governo sem rumo e sem projeto de longo prazo para melhorar a qualidade da educação brasileira; o nefasto efeito do protecionismo comercial que mantém o País afastado das cadeias globais de valor; o emaranhado de normas, leis e regulações que colocam o País entre os piores do mundo no ranking internacional do “Doing Business”, publicado pelo Banco Mundial, são apenas alguns problemas estruturais que condenam o País à baixa produtividade e aos ciclos breves de crescimento econômico medíocre.
Segundo, vamos às especulações que estão sendo tratadas como “realidade”. A primeira ilusão é que a retomada do crescimento vai atrair investidores estrangeiros. Há três categorias de investidores estrangeiros. Há o falso estrangeiro: brasileiros que possuem recursos fora do Brasil e que estão animados com a retomada do crescimento. Esses são os “estrangeiros” que estão apostando no país.
Há também o investidor institucional. Nessa categoria estão investimentos estrangeiros estatais. Fundos soberanos e empresas apoiadas pelo Estado, como é o caso do investimento chinês no país. Esse grupo está animado com projetos de infraestrutura. Afinal, se as amarras do Custo Brasil atrapalharem o andamento dos negócios, há sempre o fundo ilimitado do Tesouro para apoia-los e a pressão política do governo para fazer as coisas andarem.
A terceira categoria, os investidores estrangeiros da iniciativa privada, estão apreensivos e em compasso de espera. Já perderam dinheiro no país e se cansaram de acreditar no país do futuro que arruína o próprio futuro com escândalos de corrupção, insegurança jurídica e excesso de burocracia e de intervenção voluntarista do Estado na economia. Esses aguardam sinais claros de mudança de atitude, de leis e de postura do governo para poder voltar a investir no país.
Voo de galinha
A segunda ilusão é que o otimismo com a retomada da economia vai ajudar a impulsionar as reformas políticas. O timing político não tem correlação com o timing econômico.
Aprovamos a reforma da previdência no meio de uma recessão. A aprovação da reforma foi fruto de negociação política em torno de uma proposta que contou com o apoio da população e dos parlamentares. As reformas tributária e administrativa serão aprovadas no Congresso se o governo, parlamentares e a opinião pública trabalharem em torno da construção de propostas politicamente viáveis, como foi o caso da reforma previdenciária. Não tem nada a ver com a economia.
Acabou a lua de mel do mundo com o Brasil. Ou aprovamos as reformas constitucionais, abrimos a economia e nos livramos da intervenção voluntarista do Estado na economia, ou vamos continuar sendo o país do voo de galinha; breves espasmos de crescimento seguido de longos períodos de estagnação.