Bolsonaro sob a ótica do mais sábio pensador político da história a propor uma análise das ações de um líder: Nicolau Maquiavel.
Nicolau Maquiavel (1469 -1527) não foi o primeiro pensador político a explicar e sugerir ações um líder do ponto de vista do benefício do próprio líder. Foi o mais sábio. Na mais conhecida de suas concepções o autor florentino aconselha o príncipe a “fazer o mal de uma só vez e o bem aos poucos”. Maquiavel aconselha o líder a estar sempre atento a não governar ao sabor das circunstâncias fortuitas, da “Fortuna”, ou seja, da sorte e seu cardápio de acontecimentos incontroláveis. Mas como vencer a Fortuna? Com a habilidade da liderança para agir a partir de uma deliberação madura e precisa, com a “Virtù”, ensina Maquiavel.
A tensão constante entre “Virtù” e “Fortuna”, portanto, define uma liderança política. Todo líder pode ter a sorte a seu favor e, se dotado de “Virtù”, saberá se beneficiar e a todos os demais. Mas o que dizer quando a sorte lhe bate à porta, mas falta-lhe habilidade para aproveitar integralmente o bom momento?
Bolsonaro sob a ótica de Maquiavel
Jair Bolsonaro, de certa maneira, encarna esses dois cenários. Primeiro, soube ler o momento político. Com poucos recursos financeiros, sem partido forte e com um discurso que atendia às expectativas dos eleitores por mudança, Bolsonaro conseguiu derrotar lideranças dos principais partidos brasileiros como o PSDB, PT, MDB e PDT. Havia um deserto político e a Fortuna lhe sorriu. No segundo momento, já empossado, poderia ter passado uma borracha sobre o período eleitoral, esquecido as hostilidades e focado em reverter as deterioradas expectativas econômicas. Se no primeiro momento soube aproveitar as circunstâncias fora de seu controle, no segundo perdeu a chance de cavalgar melhor as circunstâncias favoráveis.
Passados nove meses, temos uma lista de decisões na área econômica que apontam na direção correta: início das privatizações para reduzir os custos do Estado, aprovação da Reforma da Previdência e início das discussões sobre as reformas administrativa e tributária. Faltou, na visão de alguns economistas, um conjunto de medidas paliativas para estimular mais fortemente a geração de empregos e aliviar as pressões sociais, enquanto as reformas não entregam os frutos esperados.
Governos formados por lideranças que nunca haviam ocupado o Executivo são mais propensos a produzir crises, frutos dos ajustes necessários para a conquista da governabilidade. Talvez esse primeiro ano tenha sido um necessário período de aprendizado. Vamos torcer para que seja esse o caso. Pode ser também que, a exemplo do seu “grande irmão do Norte”, Bolsonaro tenha optado por saltar de crise em crise encenando um espetáculo de permanente tensão que sirva para embaralhar a visão da plateia e tirar o foco de seu desempenho na presidência. Seja como for, a estratégia embute riscos.
A mais evidente escassez da “Virtù”, porém, se observa na política. Ainda não é possível dizer ao certo se por desenho ou por temperamento, Bolsonaro se empenha diariamente em se colocar no meio de crises. Se elas não se instalam pelo próprio andar da carruagem em Brasília, o presidente as produz nas conversas com os jornalistas. A mais recente crise é um enigma envolto em uma charada. Bolsonaro resolveu brigar em público com o PSL, o partido que lhe dá sustentação no Congresso, votando exatamente como o governo determinou em 99,9% dos casos. Não existe precedente de uma crise desse tipo na história das democracias.
Bolsonaro e os filhos podem ter aberto uma guerra contra o PSL com objetivo de se apoderar da agremiação e controlar suas verbas. Mas fazer isso publicamente, enfraquecendo sua capacidade de coordenação no Congresso, em plena votação das reformas? Não faz sentido, a não ser que o intento, impensável, seja torpedear as próprias reformas. Seria o fim do governo.