Em um único dia, a Petrobras, maior companhia do país, perdeu um quinto de seu valor. Mas o prejuízo é muito maior. As intervenções populistas de Bolsonaro minam a confiança dos investidores num momento em que os brasileiros enfrentam a pandemia e uma recessão econômica sem precedência.
O tombo nas ações da Petrobras e alta no dólar demostram uma ampla e crescente descrença com relação ao País. As ações erráticas e populistas de Jair Bolsonaro solapam a confiança dos investidores num momento em que os brasileiros enfrentam a dupla crise da pandemia e da recessão econômica. Foi um açoite desferido contra aqueles que estariam dispostos a aplicar o seu dinheiro em companhias e em projetos de desenvolvimento.
O Brasil, que já vinha se comportando como um pária nas relações exteriores, corre o risco de ser um pária na economia mundial, reeditando políticas desastradas e populistas que, imaginava-se, tinham ficado para trás com o fim do governo de Dilma Rousseff.
Insegurança para investidores
O prejuízo, contundo, será muito mais amplo do que o diretamente sentido pelos acionistas das estatais. O populismo de Bolsonaro terá um contágio sobre outros setores. Um exemplo são as concessões de infraestrutura: quem estará disposto a fazer um investimento de risco com retorno de longo prazo se houver o risco de o presidente mudar as regras do jogo da noite para o dia?
O que conta o câmbio
O termômetro mais evidente da crise de confiança com relação às perspectivas para o País é a cotação do dólar: quanto maior a incerteza na economia e menor o potencial de crescimento, menor o ingresso de capitais e maior a tendência de valorização da moeda americana.
Até o início do ano passado, o real vinha oscilando em linha com as moedas de outros países emergentes. Mas, como mostra uma análise do economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, a trajetória se descolou de outras moedas. É um indicativo de que o País passou ser considerado mais arriscado do que os seus pares. Foram analisados 16 países, e o real tem sido a moeda que mais perdeu valor.
O enfraquecimento do real em relação ao dólar vinha refletindo as incertezas com relação à política fiscal e o aumento da dívida pública. Pesavam também fatores como o aumento no desenvolvimento, o que fez fundos internacionais tirarem dinheiro do País. Agora, pesa sobre o ânimo dos investidores a mão pesada do intervencionismo.
A economia brasileira deveria estar se beneficiando do ciclo de valorização das commodities, o que, historicamente, amplia a entrada de divisas externas e fortalece a moeda brasileira.
Se o real estivesse em linha com a de outras moedas emergentes, a cotação do dólar estaria ao redor de R$ 4,50, e não em R$ 5,50. Isso ajudaria a mitigar a inflação e dar ânimo ao crescimento. Mas o governo vem arruinando o potencial de retomada, ao não coordenar as reformas, ao ampliar os desequilíbrios nas finanças públicas, e, por fim, ao intervir de maneira populista na economia.
O que impressiona é o silêncio cúmplice de Paulo Guedes, o ministro da Fazenda que havia prometido um choque radical de liberalismo. Até agora nenhuma privatização relevante foi concretizada. A promessa de zerar o déficit público não passou de uma miragem.
Ciclo vicioso
A alta do dólar tem consequências diretas sobre a inflação, porque a maior parte dos insumos possuem preços cotados na moeda americana. Inflação mais alta significa menor poder de compra para as pessoas. Além do mais, o Banco Central deverá antecipar a elevação na taxa básica de juros, a Selic, que poderá ser elevada no próximo mês. Juros mais altos representam encarecimento do crédito, inibindo o consumo e os investimentos. O resultado será uma retomada mais lenta da economia e a manutenção do desemprego em níveis elevados.
O Brasil mergulhou em recessão em 2014, vinha recuperando as perdas na atividade econômica, mas, então, veio a recessão da pandemia. De acordo com as estimativas de Alex Agostini, o PIB recuperará apenas em 2029 o patamar em que se encontrava no final de 2013, e isso caso não haja surpresas negativas pelo caminho. O País vai acumular uma década e meia perdida, sem nenhum avanço na renda média da população.
“A economia vai se alimentando em ciclos ruins e não consegue sair deles”, afirma Agostini. “É como um carro atolado na lama, que precisa de tração, mas não sai do lugar, desgasta as peças e pode quebrar. É essa a situação da economia brasileira.”
O Brasil, assim, corre o risco de ampliar o desalento das empresas e de todos os brasileiros com relação ao futuro. Bolsonaro ou não compreende que está sabotando a perspectiva de crescimento, ainda que tímida, ou está pouco se lixando, desde que seus rompantes autoritários satisfaçam os grupos de seus apoiadores mais fiéis. O presidente vem perdendo apoio da classe média e agora recorre ao populismo para atrair os mais pobres. É uma manobra política arriscada e cujas consequências para o País serão trágicas.
Luiz Felipe D’Avila para a Globonews
00:00A intervenção na Petrobras
01:26 Insegurança jurídica
02:30 Subsídios, corporativismo e populismo
03:37 O impacto das interferências do governo no investimento
05:22 Prioridades do Brasil