Desde o começo da crise do Covid-19 já foram apresentados ao Legislativo mais de 350 projetos de lei que legalizam o calote, como a suspensão de pagamento por serviços essenciais. Quebras de contrato desestruturam a cadeia de valor da economia. Há meios civilizados para se renegociar acordos, como a arbitragem. Em época de crise e de desgoverno, a demagogia ameaça colocar em risco o que há de mais valioso numa democracia: a confiança nas leis e nos contratos.
Em época de crise e de desgoverno, a demagogia corre solta e ameaça colocar em risco o que há de mais valioso numa democracia: a confiança nas leis e nos contratos. Um levantamento feito pelo jornal O Estado de São Paulo e o Sigalei revela que existem 352 projetos no Congresso Nacional, nas 15 principais Assembleias Legislativas e na Câmara Municipal de São Paulo “que buscam impor redução de juros em empréstimos, descontos em mensalidades escolares e suspensão de pagamentos por serviços essenciais durante a pandemia”. Ou seja, projetos de lei que legalizam o calote.
No mundo da barbárie, promessas não cumpridas e contratos não honrados justificam o emprego da violência. Invadia-se terras, sequestravam pessoas e matavam gente para vingar-se ou recuperar o que era seu de direito. Felizmente, no mundo civilizado e democrático, o estado de Direito prevalece sobre a barbárie e as diferenças são resolvidas por meio da Justiça. Esses projetos demagógicos que legalizam a quebra de contratos devem ser imediatamente rechaçados pelos órgãos legislativos. Primeiro ferem a Constituição; segundo são uma afronta ao estado de Direito e à lei; terceiro existem meios civilizados para se renegociar acordos em momento de pandemia e de “força maior”.
Arbitragem
Uma das maneiras mais céleres e eficazes de se resolver disputas sem recorrer ao moroso Poder Judiciário é por meio de arbitragem. Pouco usado no Brasil, a arbitragem é um mecanismo cada vez mais empregado para dirimir disputas em vários países. Donos de escolas e pais, bancos e clientes podem recorrer à escolha de um árbitro para resolver disputas. As decisões da arbitragem têm o mesmo valor de uma sentença judicial. Portanto, em vez de propor quebra de contratos e leis inconstitucionais, os legisladores deveriam abandonar a demagogia e fazer algo benéfico para a sociedade: incentivar a criação de fóruns de arbitragem para que as pessoas possam resolver rapidamente suas divergências legais.
Quebras de contrato desestruturam a cadeia de valor da economia
Seria um desastre para o País, para a economia e para as pessoas se recorrermos à quebra de contratos. Afinal, a quebra de um contrato desestrutura a cadeia de valor da economia. Se pais resolvem não pagar mensalidades, a escola é obrigada a fechar e demitir funcionários e professores. Esses novos desempregados perdem sua renda e, consequentemente, recorrerão ao não pagamento de suas obrigações, iniciando assim uma reação em cadeia que desestrutura a economia, agrava o desemprego, aprofunda a crise econômica e contribuiu para acirrar a já debilitada situação social do país. A crise do Covid-19 não pode ser usada como desculpa para legalizar a quebra de contratos.
As armas para superarmos a crise são a solidariedade, a cooperação e a ação coordenada entre os governos e a sociedade civil. Essas são as virtudes que nos mobilizam a ajudar as pessoas mais necessitadas; a nos esforçar para preservar empregos e renda e a nos empenhar para manter o País funcionando, a despeito dos demagogos e populistas que destroem a nação. O Brasil precisa de mais altruísmo e menos gangsterismo para nos tirar da crise.