O funcionalismo público deve servir a população ou a população deve servir o funcionalismo? A questão, nesse momento de pandemia e recessão, não é retórica nem sensacionalista. A decisão do Senado de derrubar o veto ao reajuste de servidores, em meio a uma crise profunda na economia, coloca em ameaça a estabilidade do País.
Se a decisão for mantida, quem sofrerá mais duramente as consequências será a população mais vulnerável. A conta do reajuste dos servidores poderá passar de R$ 120 bilhões e vai subtrair recursos preciosos que deveriam ser destinados à renda mínima para os mais pobres, aos projetos de educação básica e saúde. Tudo, menos engordar ainda mais os vencimentos de uma classe privilegiada da população.
Funcionários públicos são os únicos premiados na pandemia
Milhares de empresas fecham as suas portas e não sabem se voltarão a reabri-las algum dia. Milhões de brasileiros perdem o emprego ou tiveram de aceitar, resignados, a redução de seus salários. Todos sofreram duramente o golpe imposto pela crise da Covid-19. Mas uma categoria especial saiu ilesa: os funcionários públicos não tiveram os vencimentos reduzidos nem perderam os seus empregos, não foram submetidos ao estresse pela sobrevivência que é a rotina dos mais pobres, e, ainda assim, poderão ser premiados com vencimentos ainda mais graúdos.
Esse reajuste-bomba para algumas categorias do funcionalismo foi aprovado pelo Congresso, como um contrabando em meio a medidas emergenciais contra os efeitos do coronavírus. O governo, acertadamente, vetou o aumento salarial. Fazia parte do acordo com as lideranças políticas, aliás, que não haveria elevação de vencimentos nesse momento, era uma das contrapartidas para aprovar as ações emergenciais. Mas, na quarta-feira, o Senado derrubou o veto. Agora caberá à Câmara decidir se o mantém ou não.
Falta de articulação do governo
O episódio demonstra, em primeiro lugar, a incapacidade de articulação do governo e o seu grau de exposição a chantagens políticas. Mas não apenas isso. Fica claro o poder de fogo dos servidores e como eles são blindados no Congresso. Por fim, foi mais uma evidência do oportunismo que rege as ações da maior parte dos parlamentares.
Essa seria a hora de servidores e congressistas darem a sua cota no sacrifício. Seria o mínimo. Não ampliar privilégios e benefícios.
Sugestões concretas de economia para o funcionalismo público
Aqui estão algumas sugestões de algumas medidas concretas que poderiam ser feitas para economizar o suficiente para prorrogar por mais um mês o pagamento do auxílio emergencial:
Cortar penduricalhos. Acabar com o complemento salarial da elite do funcionalismo público, que engloba verba “auxílio terno” (dinheiro para comprar terno), “auxílio viagem” (dinheiro para pagar viagens), despesas com carro oficial (todo parlamentar tem carro próprio com motorista), auxílio moradia (dinheiro para pagar o aluguel de residência). Esses penduricalhos custam R$ 2 bilhões ao ano.
Congelamento do salário dos servidores estaduais e municipais por 18 meses. Haveria uma economia de R$ 15 bilhões.
Congelamento do salário dos servidores federais por 18 meses. Economia de outros R$ 5 bilhões
Cortar custo de férias do judiciário por 2 anos. Outros R$ 8 bilhões economizados.
Congressistas, servidores: façam a sua parte e deem sua cota de sacrífico para a superação da crise. Do contrário, o preço pago pelo país será enorme. As consequências serão uma queda ainda mais acentuada na economia, aumento do desemprego e queda nos investimentos produtivos. A reação negativa dos mercados, com a disparada na cotação do dólar, é apenas um alerta do que estará por vir.