Quase 30 mil empresas industriais fecharam as portas entre 2013 e 2019 e 1,4 milhão de empregos foram perdidos, apesar dos incentivos. Política equivocada reduziu a capacidade de crescimento do País
A indústria brasileira contou com diversos pacotes de apoio nos últimos anos, particularmente nos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff. Houve distribuição de créditos subsidiados para os “campeões nacionais”, o preço da eletricidade foi reduzido na marra para — supostamente — beneficiar a competitividade das companhias, setores “estratégicos” foram beneficiados com desonerações à indústria naval foi ressuscitada — sem muito sucesso — graças ao amparo estatal. Ao mesmo tempo, todas as iniciativas de abertura comercial foram abortadas. O resultado não poderia ter sido mais contraditório em relação às expectativas. A indústria brasileira encolhe ano após ano e perde relevância na economia.
Indicadores divulgados pelo IBGE, com dados até 2019, mostraram que o número de empresas industriais amargou seis anos consecutivos de retração. Quase 30 mil companhias fecharam as portas num período de apenas seis anos. Em 2013, havia 335 mil indústrias no País. Foi o maior número da série histórica. Desde então, o total caiu para pouco mais de 306 mil empresas, um recuo de 8,5%. Entre as empresas afetadas pela retração, as mais castigadas foram as de confecções e calçados: mais da metade do encolhimento no número de indústrias ocorreu nessas atividades.
Com relação ao emprego industrial, o tombo foi de quase 16% nesse período. Depois de um apogeu de mais de 9 milhões de pessoas ocupadas em 2013, o número foi reduzido para 7,6 milhões em 2019.
Pelos critérios usados pelo IBGE, há dois grandes tipos de indústria: a de transformação (fábricas de carros, eletrodomésticos, máquinas e equipamentos) e a extrativa (que atua na exploração do petróleo e outros minerais). Na análise dos indicadores, fica evidente que a grande retração ocorreu na indústria de transformação. Foi ela que, a despeito dos incentivos, retrocedeu mais intensamente nos últimos anos, tanto em número de empresas que fecharam as portas como em perda de vagas.
A extrativa sofreu menos, mas é um ramo concentrado na exploração de produtos básicos. Além disso, tem uma participação relativamente modesta no total de empregos disponíveis. Menos de 200 mil pessoas trabalham nessas empresas.
Causas da crise
A retração na indústria, apesar do amplo programa de benefícios oferecido particularmente no governo Dilma, deve-se em parte a questões estruturais. Em todo o mundo, o setor passa por adaptações que refletem o avanço da automação, da tecnologia da informação e de inovações na administração que ampliaram a produtividade. Isso fica evidente nas economias mais avançadas.
Mas no Brasil, um país ainda em desenvolvimento, a desindustrialização tem sido precoce. As políticas protecionistas e corporativistas não funcionaram como o governo esperava. Pior: aprofundaram desequilíbrios na economia que levaram à recessão econômica, o que contribuiu para a debacle industrial. Era um resultado previsto, conforme os muitos críticos do programa protecionista haviam alertado. Os avisos foram ignorados por um governo com ideias antiquadas e por empresários pouco afeitos à competição.
Sem reformas de fundo, a indústria vai minguando. Na pauta de exportações brasileiras, as manufaturas representavam aproximadamente 80% do total até 2005. Hoje a participação está ao redor de 50%. Nos últimos 20 anos, o PIB industrial acumula uma alta de apenas 30%, enquanto o da agricultura cresceu mais de 200%. A perda de vigor industrial se intensificou justamente depois do governo Dilma — o governo que gastou bilhões em sua defesa.
Nos anos 2000, a indústria chegou a viver um período de alta, empurrada pelo aumento do consumo interno e também para as exportações para os outros países da América do Sul. Mas a sequência de crises mostrou que era um crescimento incapaz de se sustentar: não foram feitas as reformas necessárias para aumentar a produtividade do setor privado. Governos populistas e estatistas tentaram o atalho ilusório do protecionismo e dos subsídios. O resultado foi a profunda crise dos últimos anos.
O Brasil permanece preso à armadilha do baixo crescimento: não se abre à competição porque não é competitivo, mas como não se abre não se torna mais competitivo. A produtividade não cresce. A produção industrial depende de espasmos de retomadas na economia brasileira e internacional, como começa a ocorrer agora. É pouco.
As projeções recentes do Fundo Monetário Internacional indicam como o Brasil continua avançando abaixo da média mundial e bem abaixo dos países emergentes. O PIB brasileiro deverá ter uma expansão de 5,3% neste ano e de 1,9% em 2022, contra um avanço global de 6% e 4,9% nesse período. Os emergentes vão crescer ainda mais: 6,3% e 5,2%.
IMF Growth Projections: 2021
USA🇺🇸: 7%
Germany🇩🇪: 3.6%
France🇫🇷: 5.8%
Italy🇮🇹: 4.9%
Japan🇯🇵: 2.8%
UK🇬🇧: 7%
Canada 🇨🇦: 6.3%
China🇨🇳: 8.1%
India🇮🇳: 9.5%
Russia🇷🇺: 4.4%
Brazil🇧🇷: 5.3%
Mexico🇲🇽: 6.3%
KSA🇸🇦: 2.4%
Nigeria🇳🇬: 2.5%
South Africa🇿🇦: 4%https://t.co/yxs2PsGbgB #WEO pic.twitter.com/GpKoLpAPxO— IMF (@IMFNews) July 27, 2021
No livro “The Power of Creative Destruction” (ainda sem tradução no Brasil), Philippe Aghion, Céline Antonin e Simon Bunel, todos ligados ao Collège de France, argumentam que a prosperidade requer um ambiente institucional que incentive a competição e a incorporação de novas tecnologias. O aumento na riqueza dos países deriva do acúmulo de inovações “destrutivas”. Dizem também que em um ambiente dominado por grandes corporações monopolistas haverá sempre um lobby poderoso contra a competição — e a produtividade fatalmente será abalada.
Sob o manto da proteção estatal, a indústria pouco investe em tecnologia de ponta e só sobrevive, com muita dificuldade, na base de mais proteção. A retração dos últimos anos demonstra que o capitalismo brasileiro precisa ser salvo de governos populistas — e também dos capitalistas protecionistas e corporativistas.