É errada a percepção de que só existe vida inteligente em Brasília na equipe econômica do ministro Paulo Guedes.
Pior do que ministros despreparados são ministros despreparados com iniciativa. Esse segundo tipo parece ser o mais abundante na Esplanada dos Ministérios. Pelo menos essa é a percepção mais palpável que brota do conjunto das reportagens jornalísticas produzidas sobre o atual governo. Mas essa sensação não se explicaria apenas pelo fato de que os holofotes tendem a focar os ministros trapalhões com mais frequência?
Virtù analisou o fenômeno com mais cuidado. O resultado é surpreendente: além da óbvia ilha de excelência criada pelo economista Paulo Guedes em sua pasta, existem outras áreas do primeiro escalão do governo entregues a técnicos competentes e discretos, cujos esforços tendem a passar quase despercebidas pelo radar da imprensa.
Competência e discrição descrevem bem o ministério da Infraestrutura, chefiado por Tarcísio Gomes de Freitas. Os mesmos atributos podem ser associados à pasta da Agricultura, da ministra Tereza Cristina. Os dois são responsáveis por tocar projetos viáveis, relevantes para o país e, surpreendentemente, muito bem coordenados entre eles. O gabinete de Cristina tem conseguido assegurar a tranquilidade dos produtores rurais e criar meios para aumentar a produtividade do campo sem avanço sobre as fronteiras das áreas de preservação ambiental. Por seu turno, Freitas e sua equipe estão agilizando as concessões nas áreas de infraestrutura e logística fundamentais para escoar a produção agrícola nacional. Tudo sem alarde.
Tarcísio Gomes de Freitas | Ministério da Infraestrutura
Engenheiro militar, o ministro Tarcísio Freitas foi chefe do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DNIT) e da Coordenação de Projetos da Secretaria Especial do Programa de Parceria de Investimentos (PPI). Acumulou nessas funções um tipo de sabedoria que costuma ser rara em Brasília: a de preservar os projetos e hábitos de sucesso dos governos anteriores. Essa tem sido sua marca registrada no governo e, para muitos, a razão de seu sucesso até agora;
Ao assumir o ministério, no início do ano, Tarcísio Freitas manteve uma parte da equipe do antigo governo e assumiu o compromisso de realizar 23 concessões no primeiro semestre. A promessa foi cumprida nos primeiros cem dias de trabalho. Em março, 12 aeroportos foram concedidos à iniciativa privada por R$ 2,3 bilhões – mais R$ 1,9 bilhão será pago nos próximos 30 anos.
Dez áreas portuárias renderam R$ 219 milhões aos cofres públicos. “Temos outros 20 projetos sendo preparados para esse setor”, anunciou o ministro. O setor ferroviário também entrou no pacote. Depois de 12 anos, o primeiro leilão foi o da ferrovia Norte-Sul. Ao todo, 1,5 mil quilômetros de linhas de trem entre Estrela d’Oeste (São Paulo) e Porto Nacional (Tocantins) foram arrematadas por R$ 2,7 bilhões.
Os planos do ministro são ambiciosos. Até 2022, Freitas pretende que R$ 150 bilhões sejam investidos por meio de concessões em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Pelo que já foi mostrado até agora, não será surpreendente se fizer mais do que isso.
Tereza Cristina | Ministério da Agricultura
Muito antes de se tornar ministra da Agricultura, Tereza Cristina, já era reconhecida como uma das principais especialistas do agronegócio brasileiro. Formada em engenharia agrônoma, entrou para a política no ano de 2007, como secretária de Agricultura do governo do Mato Grosso do Sul, um dos maiores produtores do país. Permaneceu no cargo por oito anos, até ser eleita deputada federal em 2014.
No primeiro mandato, foi indicada chefe da Frente Parlamentar de Agricultura, a bancada mais poderosa do Congresso Nacional. O trabalho garantiu-lhe o respeito do setor, que avalizou sua indicação para o ministério, e o ódio dos ambientalistas, que lhe deram o epíteto de Musa do Veneno, por ter encampado a aprovação do projeto que flexibiliza o uso de agrotóxicos.
Seu principal desafio à frente da pasta foi garantir os R$ 225 bilhões do Plano Safra em um ano de profunda crise e contingenciamento de recursos. O plano é fundamental na oferta de crédito barato para que os produtores rurais possam investir no custeio, comercialização, industrialização e investimentos. Mas dependia da aprovação de um projeto de lei, o PLN 4, pela Comissão Mista de Orçamento.
Por conta disso, o Plano Safra quase subiu no telhado. A articulação do governo não andava tão boa. E o prazo para aprovar o projeto estava prestes a vencer. A ministra teve que abrir um canal direto de negociação com os parlamentares para explicar a situação. O PLN 4 foi aprovado e o Plano Safra, anunciado.
Outro programa implementado pelo ministério foi uma ferramenta de análise dos cadastros do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SICAR). Em fase de implementação, o recurso serve para dar mais celeridade à análise dos cerca de 6 milhões de proprietários rurais cadastrados que podem ter acesso aos Programas de Regularização Ambiental.
Agora, Cristina está de olho no mercado externo. O acordo entre Mercosul e União Europeia passou com fortes críticas dos ambientalistas europeus. Além disso, a pecuária brasileira sofreu recentemente com os impactos dos embargos chinês e russo à carne bovina brasileira. No final do ano passado, a Rússia voltou a comprar o produto. Já a situação com a China foi contornada no mês passado pelo governo. Acostumada à lida do campo, Tereza Cristina já está colhendo os bons resultados de seu esforço. Que Tarcísio e Tereza façam escola e seus exemplos frutifiquem em Brasília.