Ensino precisa preparar os jovens para um mercado de trabalho que passa por uma reconfiguração, alerta o economista, especialista em políticas sociais e superintendente do Instituto Unibanco. Prejuízo educacional causado pela pandemia ameaça renda futura dos alunos, especialmente entre os mais pobres
De um lado, desemprego recorde: 15 milhões de brasileiros procurando uma oportunidade. De outro, ofertas de emprego que não são ocupadas, porque faltam trabalhadores com as qualificações necessárias. Parece paradoxal, mas não é, afirma o economista Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco e especialista em políticas sociais. “Está havendo uma reconfiguração do mercado de trabalho”.
Henriques foi secretário Nacional de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação e secretário-executivo do Ministério de Desenvolvimento Social, quando coordenou o desenho e a implantação inicial do programa Bolsa Família. À frente do Instituto Unibanco, dedica-se à melhoria da educação pública no País — que, apesar dos avanços dos últimos anos, mantém-se como um dos grandes obstáculos ao desenvolvimento brasileiro.
“Temos um risco real de sermos um país de renda média com desemprego estrutural crônico”, alerta Henriques, em sua conversa com o Virtù. “Falta mão de obra qualificada, e tudo começa no ensino básico. Não podemos produzir educação de qualidade apenas para alguns”.
De acordo com o economista, a “década perdida” do ensino foi nos anos 1970, quando a economia vivia o seu “milagre econômico”. O governo optou por ampliar o acesso ao ensino, mas sem se atentar para a qualidade. “Foi uma visão míope. O Brasil alavancou o crescimento com uma parcela pequena da população. A conjuntura era favorável, poderíamos ter feito massificação com qualidade”.
Além do atraso histórico, o País terá que lidar agora com as consequências da interrupção causada pela pandemia. A paralisação de aulas presenciais chegou a 13 meses no Brasil, contra uma média mundial de 5 meses. Os estudos mostram que o ensino remoto tem menor engajamento, sobretudo entre os estudantes mais pobres.
O estudo “Perda de Aprendizagem na Pandemia”, elaborado pelos professores Ricardo Paes de Barros e Laura Muller Machado, do Insper, em parceria com o Instituto Unibanco, revelou que os estudantes brasileiros poderão ter perdas permanentes, caso não sejam feitas ações para compensar os prejuízos educacionais. Um exemplo: a queda ocorrida no aprendizado em matemática pode levar a uma diminuição de até 10% da remuneração ao longo da vida desses alunos, se não houver ações para mitigá-la.
“A pandemia terá efeito de cauda longo. Não vamos resolver em um semestre”, diz Henriques. “Precisamos de uma agenda estratégica para 2022 e 2023. Será importante também termos políticas de renda, para evitar a evasão escolar. Assim poderemos recuperar o atraso e colocar a educação em um nível acima daquele em que estava antes da pandemia”.