Ganha toda a sociedade brasileira. As exceções são os poucos agentes que hoje se apropriam dos enormes custos de transação gerados pelo sistema atual.
ARTIGO | Bráulio Borges, pesquisador-associado do IBRE/FGV e economista-sênior da LCA
O debate sobre a necessidade de promover reformas no sistema tributário brasileiro não é novo. Foram várias as tentativas de reformá-lo, sem muito sucesso.
A atualização e modificação de vários aspectos do sistema tributário se tornou ainda mais imperiosa ao longo do tempo. Seja por conta de alguns desenvolvimentos ocorridos no resto do mundo (“guerra fiscal” mundial na tributação sobre o capital/empresas), seja por conta da forte elevação da carga tributária brasileira, ocorrida entre o final dos anos 1990 e meados da década seguinte. Isso refletiu na necessidade de uma expressiva consolidação fiscal após a estabilização da inflação com o Plano Real.
O sistema tributário atual
Com efeito, desde meados da década de 2000, observa-se a convivência no País de dois aspectos deletérios. Uma carga atipicamente elevada, dado nosso nível de desenvolvimento econômico, e desproporcionalmente concentrada na tributação sobre consumo; e um sistema altamente complexo e com vários atributos ruins. Estes aspectos acabam magnificando os impactos da carga mais elevada sobre a atividade, a competitividade, o desenvolvimento econômico e o bem-estar da sociedade.
A reforma do sistema tributário
Quando se discute o assunto “reforma tributária” no Brasil deve ficar claro que isso significa, hoje, promover alterações no desenho do sistema, de modo a torná-lo menos distorcivo para a eficiência econômica, bem como para torná-lo mais progressivo e menos complexo. Infelizmente não há espaço, no momento, para qualquer redução da carga tributária agregada (ainda que alguma realocação da carga entre as várias bases de incidência – consumo, renda, folha salarial e patrimônio – possa trazer impactos líquidos favoráveis para a economia brasileira).
Embora não seja possível alterar a carga agregada, há um espaço expressivo para a promoção de melhorias no desenho do sistema, como deixa evidente, por exemplo, o levantamento Doing Business, do Banco Mundial. O levantamento aponta que, em termos relativos, o componente do ambiente de negócios que mais prejudica a competitividade brasileira é o sistema tributário.
A PEC 45/2019
É nesse contexto que se insere a proposta de reforma da tributação indireta consubstanciada na PEC 45/2019, apresentada pelo deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP) e baseada nos estudos que vêm sendo realizados há alguns anos pelo Centro de Cidadania Fiscal (CCiF). A PEC propõe a substituição de cinco tributos atuais (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um único Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), cobrado de forma não cumulativa e no destino (onde efetivamente os produtos são consumidos).
Embora a reforma da tributação indireta sobre bens e serviços não seja o único item relevante da agenda de reforma tributária – que envolve também a revisão da tributação sobre a renda, da folha de pagamento, do patrimônio e de regimes simplificados –, trata-se de um tema importante, dadas as distorções provocadas pelo atual desenho da tributação indireta brasileira.
Impacto das distorções do sistema tributário
Dentre essas distorções, destacam-se a enorme complexidade do sistema atual (que resulta em alto custo de conformidade e alta litigiosidade), a tributação na origem (que estimula guerra fiscal entre os Estados), a oneração de exportações e investimentos e o estímulo à verticalização ineficiente decorrente da cumulatividade. No agregado, tais distorções tendem a reduzir a produtividade, a taxa de investimento e o potencial de crescimento da economia brasileira.
Impactos da PEC 45/2019
De fato, quando busquei estimar os impactos macroeconômicos da reforma da PEC 45/2019, cheguei a resultados expressivos, com um PIB cerca de 20% maior em 15 anos considerando apenas os efeitos diretos – isto é, sobre o ambiente de negócios encarado pelas firmas. Considerando também os efeitos indiretos – sobretudo sobre a solvência fiscal, já levando em conta o ponto de partida ainda mais frágil no pós-Covid-19 –, esse impacto chega a impressionantes 33% em 15 anos (a nota técnica com todos os detalhes está disponível no site do CCiF).
Portanto, a reforma proposta pela PEC 45/2019 – ainda que gere alguma realocação de receitas e carga entre unidades da federação e entre setores econômicos, de forma bastante suave ao longo de muitos anos, – não corresponde a um jogo de soma zero: toda a sociedade brasileira tende a ser ganhadora caso ela seja aprovada pelo Congresso. As exceções são aqueles poucos agentes que hoje se apropriam dos enormes custos de transação gerados pelo sistema atual.