Essa semana, o Congresso colocará em votação a PEC Emergencial. Daniel Duque, head de inteligência do Centro de Liderança Pública (CLP), calcula que, se aprovada, a PEC traria aos estados e municípios uma economia de até R$ 79 bilhões nos próximos dez anos. Trata-se de um volume de recursos equivalente ao dobro do orçamento anual do Bolsa Família.
No Brasil existem emergências e emergências. Os políticos estão mobilizados para aprovar o quanto antes a prorrogação do auxílio emergencial – uma iniciativa indiscutivelmente necessária diante da perspectiva de aumento na pobreza, mas que também é sabidamente uma alavanca para a popularidade do governo. O senso de emergência, porém, arrefece quando o assunto é a aprovação de reformas que limitem o aumento dos gastos públicos. A lógica predominante em Brasília é autorizar despesas e depois pensar como financiá-las, de preferência jogando a conta para as gerações futuras.
A PEC Emergencial, apresentada no final de 2019, repousa nas gavetas do Congresso há mais de um ano. Trata-se de um projeto essencial para dar flexibilidade à administração das finanças públicas e possibilitar que o governo federal, os estados e os municípios ampliem os investimentos na melhoria dos serviços prestados. Essencialmente, a legislação estabelece dispositivos para conter a escalada explosiva dos gastos com o funcionalismo. No ritmo atual, prefeitos e governadores ficarão com espaço de manobra mínimo para fazer obras básicas para aprimorar os serviços públicos, porque o orçamento será quase todo consumido pelo pagamento de salários e aposentadorias. Essa já é, aliás, a realidade de alguns estados e centenas de municípios.
Uma nota técnica elaborada pelo economista Daniel Duque, head de inteligência do Centro de Liderança Pública (CLP), dá uma ideia do possível do impacto da PEC, caso aprovada: estados e municípios poderiam poupar até R$ 79 bilhões nos próximos dez anos. Trata-se de um volume de recursos equivalente ao dobro do orçamento anual do Bolsa Família.
Inchaço público
Entre 2008 e 2018, o número de funcionários públicos cresceu 10%, considerando-se todas as esferas de poder. Ao mesmo tempo, os salários desses servidores aumentaram, na média, acima da inflação e acima também dos salários pagos na iniciativa privada.
Como consequência, os gastos com o funcionalismo foram abocanhando uma parcela cada vez maior dos orçamentos, sobrando menos recursos para investir nos serviços básicos. Falta dinheiro para tapar os buracos nas ruas, abrir novas creches, treinar professores e equipar os postos de saúde. De acordo com estimativas do Tesouro Nacional, em muitos estados e municípios o investimento realizado é insuficiente até mesmo para repor a depreciação da infraestrutura existente.
O que diz a PEC
No caso do governo federal, a PEC Emergencial estabelece uma série de gatilhos compensatórios que podem ser acionados para preservar o equilíbrio das finanças. Esses dispositivos envolvem o congelamento de reajustes salariais, a proibição de novos concursos e a possível redução da jornada de trabalho dos servidores em até 25%, com redução proporcional dos vencimentos. Vale notar que são medidas muito parecidas com as que foram adotadas pelo setor privado no último ano, em meio à pandemia. Na esfera pública, ao contrário, não houve ajuste nenhum: os funcionários tiveram os salários intocados, mesmo, não raro, trabalhando menos.
O pagamento de salários e aposentadorias dos inativos é a segunda maior despesa da União, atrás apenas da Previdência Social. Não existe solução de longo prazo para as finanças públicas que não passe pela contenção desses gastos, por meio da aprovação de ajustes estruturais como a reforma administrativa e a PEC Emergencial.
Essa PEC já era emergencial em 2019. Agora, no pós-pandemia, é ainda mais. A dívida pública saiu de 56% do PIB em 2014 e superou 90% do PIB em 2020. Deverá atingir 100% do PIB em 2024. País em desenvolvimento nenhum carrega um endividamento tão pesado quanto o brasileiro.
Estados e municípios
No caso de governos estaduais e municipais, os gatilhos previstos poderão ser acionados quando o gasto corrente supere 95% das receitas.
Atualmente, apenas seis estados não estouram algum dos limites de gastos com pessoal estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Dez estados ultrapassam o teto máximo de consumir 60% do orçamento como a folha de pagamento dos servidores.
Como estima Duque, caso os estados respeitassem os limites da LRF, teriam uma folga de R$ 36 bilhões para realizar investimentos, considerando-se os números de 2019. O valor é superior aos investimentos efetivamente feitos naquele ano, que foram de R$ 34 bilhões.
Nos grandes municípios, a situação é parecida. Avaliando as 404 maiores cidades do País, 91 deles gastam mais de 54% de suas receitas com salários e aposentadorias e 39 estouram o teto legal de 60%.
O governo não estimou o possível ganho para estados e municípios com a PEC. Mas de acordo com os cálculos de Duque, a economia poderia chegar a R$ 79 bilhões nos próximos dez anos, graças ao acionamento dos gatilhos previstos pela legislação. O valor se somaria aos R$ 50 bilhões poupados pelo governo federal nesse período, segundo as projeções da equipe econômica.
Afirma Duque: “A PEC Emergencial, se aprovada, terá significativa capacidade de permitir que ajustes fiscais sejam feitos com maior qualidade e menor custo político. O setor público tem grande dificuldade de manter a sustentabilidade de suas contas, principalmente devido à grande rigidez de seus gastos com pessoal”.
Prefeitos e governadores precisam se mobilizar pela aprovação da PEC Emergencial. São eles os grandes interessados nesse projeto, porque assim terão mais flexibilidade para ajustar as finanças de seus municípios e estados e maior capacidade para investir nos serviços essenciais à população. O Brasil não suporta mais a criação de novos gastos sem que haja a contrapartida no controle das antigas despesas.