Affonso Celso Pastore, Alexandre Schwartsman, José Alexandre Scheinkman, Mario Mesquita e Tony Volpon apontam os riscos e oportunidades para o Brasil no atual ciclo da economia mundial
Peter Irons, em sua magnífica história da Suprema Corte dos Estados Unidos, fala dos esforços dos estudiosos para estabelecer um parâmetro de grandeza com o objetivo de classificar os juízes que por ali passaram. Irons diz que acima da retórica e do conhecimento jurídico prevaleceu como o principal critério de grandeza “a capacidade de identificar e tratar dos grandes temas do seu tempo.” Por tal critério, os economistas ouvidos pelo VirtuNews em 2019 e aqueles que contribuíram com artigos para nossa publicação, foram grandes. Eles focaram nos temas essenciais apresentados ao Brasil pela nova realidade estrutural do mundo. A saber, a “japanização” das economias com inflação baixa, taxas de juros tendendo para zero, crescimento medíocre e o grande desafio que essa inflexão acarreta: o aumento da produtividade como arma mais efetiva para vencer a imobilidade.
Riscos e oportunidades
Para o professor Affonso Celso Pastore, a tendência de queda das taxas de juros ao redor do mundo não é algo temporário, e sim estrutural, uma vez que a principal causa do fenômeno é a transição demográfica – pessoas vivem por mais tempo e, por isso, poupam mais enquanto jovens.
Embora essa transição aconteça também no Brasil, por aqui as causas da queda dos juros são mais amplas. A reforma da previdência, por exemplo, vai gerar um aumento da poupança do governo que terá como efeito redução da taxa real neutra de juros. Essa é a hora de o Brasil focar sua energia em políticas econômicas que aumentem a produtividade do trabalho. Devemos usar esse ciclo de um longo período de juros reais baixos em benefício do País.
Para José Alexandre Scheinkman, o Brasil poderia aproveitar o longo período de baixo crescimento mundial para atrair investimento se tivesse sistemas de regulação e jurídico decentes. É o momento de realizar reformas fundamentais para retomar o crescimento, abrir a economia e investir em infraestrutura e tecnologia. Temos centros de excelência, mas é preciso apostar tanto nos avanços tecnológicos, quanto em produtividade.
A Lei da Liberdade Econômica, por exemplo, é um bom caminho, mas é preciso fazer a reforma a tributária para abrir o País para o exterior. Houve o acordo entre Mercosul e União Europeia, mas temos que superar a crise gerada pelo mau comportamento do Brasil na questão ambiental. O país está fora de muitas cadeias de produção que são importantes no mundo inteiro.
Para Mario Mesquita, a perspectiva de desaceleração global representa um desafio adicional ao Brasil, seja pelo tradicional canal do comércio exterior, pelas interconexões do setor financeiro ou evolução dos preços de matérias primas.
A questão que se coloca, portanto, é o que pode ser feito no âmbito da política econômica para limitar o contágio da iminente desaceleração global e assegurar que não venhamos a entrar em novo período recessivo.
Para Tony Volpon, o maior desafio será prever as reações da política econômica mundial caso a recessão se apresente.
O economista atribui grande parte da desaceleração da economia mundial à guerra comercial EUA X China. Para Volpon, a ela é uma dimensão da concorrência geopolítica entre superpotências, que deve durar por muitos anos e será o grande tema das próximas décadas.
A saída para a desaceleração seria o uso agressivo da política fiscal nos países que enfrentam juros negativos, onde os investidores estão literalmente pagando para entregar recursos. Muitos países podem aproveitar esse “dinheiro de graça” e investir em projetos de infraestrutura para aumentar seu potencial de crescimento e escapar da “estagnação secular”. Há oportunidades em todas as crises, basta vontade política.
O Brasil perdeu uma grande oportunidade nesse sentido: atravessamos esse período fazendo uso de uma política de expansão do crédito a partir dos bancos públicos voltada ao consumo, e não ao investimento em infraestrutura que tanto precisamos.
O foco de Alexandre Schwartsman foi apontar os sinais do fim de um dos mais longos períodos de crescimento da economia mundial. Ainda que lento, foram dez anos. Apesar de preocupante, a futura recessão não terá as dimensões daquela de 2008, pois não há os mesmos excessos financeiros e o sistema bancário se encontra mais sólido.
Os efeitos sobre o Brasil terão direções opostas: o País perderá fôlego exportador, seja pelo menor crescimento, seja pela redução de preços de commodities. Por outro lado, não deveremos ver grandes pressões de depreciação do real, nem pressão para cima nas taxas de juro, pelo contrário.
Assim, a dinâmica de recuperação da economia brasileira dependerá principalmente do que for feito na frente doméstica, em particular no que se refere às reformas que alterem o panorama sombrio para as contas públicas nos próximos anos.
Perspectiva 2020
No apagar das luzes de 2019, a sensação geral foi a de que escapamos de um ano que chegou a se anunciar desastroso. Mas a nave foi preparada para enfrentar a tempestade externa, especialmente pela aprovação da Reforma da Previdência. Isso fará a diferença em 2020. Entramos no próximo ano com juros na mínima histórica, inflação controlada, risco país baixo, primeira e segunda derivadas do PIB positivas, lei de liberdade econômica adotada, relação dívida pública/PIB caindo, progressos mesmo tímidos na desestatização, acordos de comércio com UE e EFTA, a retomada da iniciativa da reforma tributária e o consenso sobre a inevitabilidade de uma reforma administrativa. Já há algo a comemorar quando um ano começa sem que se seja obrigado a ser otimista ou pessimista, podendo-se ser simplesmente realista.