Artigo de Daniel Duque e Felipe Drummond
Existem inúmeras propostas em tramitação no Congresso destinadas a enfrentar mazelas crônicas do País. São leis e emendas constitucionais cujos objetivos, por exemplo, são reduzir a extrema pobreza ou estabelecer as bases para o crescimento econômico sustentado.
Um tema em debate é a criação de um programa de renda básica capaz de assegurar ganhos para as parcelas mais pobres da população e lhes proporcionar condições mínimas de bem-estar. O desenho de um programa dessa natureza, evidentemente, deve observar as restrições fiscais do Estado brasileiro, especialmente em um período de rápido avanço do endividamento público, como o atual.
Nessas circunstâncias, o combate às desigualdades passa pelo aprimoramento dos programas sociais existentes, entre eles o Bolsa Família, o Abono Salarial, o Salário Família e o Seguro-Desemprego, no lugar de simplesmente ampliar o alcance deles. Por intermédio de alterações pontuais, é possível melhorar a focalização e fazer os recursos chegarem a quem deles necessita de fato, unificar programas para simplificar a rede de proteção social e evitar sobreposições. É possível ainda alinhar incentivos à inclusão produtiva e à formalização.
Ocorre que, a despeito de sua inegável relevância, programas de redistribuição de renda não são necessariamente a melhor maneira de enfrentar nossa dificuldade histórica em reduzir a pobreza. Evidências crescentes indicam que a distribuição de renda consiste em variável persistente no tempo e que políticas públicas que redistribuem renda em detrimento do crescimento econômico podem ser pouco eficazes na diminuição da pobreza.
Essa é a conclusão de um estudo conduzido por Roemer e Gugerty (1997) em 26 países emergentes. De acordo com os autores, países com políticas macroeconômicas sólidas alcançaram taxas mais elevadas de crescimento econômico, o que impactou positivamente o esforço de redução da pobreza, ainda que a desigualdade tenha aumentado ligeiramente. Outros dois estudos, realizados por Warr (2001) e Agrawal (2008), corroboram esses achados.
Em comum, os estudos nos dizem que a elevação da renda média, que só pode ser alcançada por meio de crescimento do PIB, parece ser a maneira mais efetiva de redução da pobreza. A proporção da população com insuficiência de renda é determinada, principalmente, pelo nível médio de rendimento dos 40% mais pobres de um país. Como se vê nos gráficos abaixo, esse indicador tem associação positiva mais forte com o PIB per capita do que com a distribuição de renda.
Podemos simular qual seria a renda média dos 40% mais pobres se o Brasil tivesse uma renda tão bem distribuída ou um PIB per capita tão alto quanto os países de renda elevada. O gráfico abaixo mostra que, de fato, uma paridade do PIB por pessoa em média com os países desenvolvidos levaria a um crescimento da renda dos mais pobres de US$ 60 para US$ 180 mensais, enquanto a paridade em termos de distribuição de rendimentos levaria a um aumento para apenas cerca de US$ 100.
Nas últimas três décadas, a renda dos mais pobres cresceu significativamente em praticamente todos os países em desenvolvimento. Considerando o rendimento de todos os 40% mais pobres desses países, a média subiu de US$ 32 mensais na década de 1990 para mais de US$ 60 nos anos 2010, um ganho de quase 100%.
Os países emergentes, que viram a produtividade de seus trabalhadores aumentar em até 10 vezes nas últimas três décadas (caso da China), têm tido desempenho econômico significativamente superior ao dos países desenvolvidos. Como consequência, enormes parcelas de suas populações, incluídos os mais humildes, vêm experimentando ganhos de renda sustentáveis ao longo dos anos.
Fazendo a decomposição dos dados, vemos que o aumento do PIB per capita foi responsável por 54% da elevação nos rendimentos dos mais pobres, enquanto a melhora da distribuição de renda teve peso de apenas 26%. Considerando os países separadamente, 18 dos 30 casos de crescimento da renda dos mais pobres nesse período foram explicados pelo aumento do PIB per capita em mais de 50%.
Um olhar sobre a produtividade do trabalhador brasileiro, entretanto, aponta que a quantidade de produto obtido por unidade de trabalho utilizado tem se mantido inalterada nos últimos 30 anos. A estagnação está relacionada com o baixo crescimento da economia nesse período, cuja média anual foi de apenas de 1,6%. Desse modo, o aumento no rendimento dos mais pobres no país teve como principal explicador, nas últimas décadas, a redistribuição. A apropriação da renda pelos 40% mais pobres passou de 8,2% na década de 1990 para 10,9% nos vinte anos seguintes. No entanto, os índices de pobreza voltaram a crescer recentemente e terão uma nova alta após a diminuição (e iminente fim) do auxílio emergencial.
Disso decorre a importância da aprovação pelo Congresso das propostas defendidas pelo movimento Unidos Pelo Brasil. Essas medidas buscam solucionar problemas prementes do país, de modo a favorecer mudanças estruturais. São iniciativas capazes de promover a atração de investimentos em infraestrutura, aprimorar o ambiente regulatório e favorecer a segurança jurídica, resultando na maior eficiência do Estado. Fazem parte da lista de projetos tidos como prioritários as reformas tributária e administrativa, a PEC Emergencial e os marcos regulatórios do setor elétrico e do saneamento. São reformas que, em última instância, impulsionam o crescimento do PIB brasileiro e geram aumento da renda.
Uma estimativa do Centro de Liderança Pública (CLP) projeta que as medidas defendidas pelo Unidos Pelo Brasil levariam o PIB a ter um crescimento adicional superior a 12 pontos percentuais até 2024. Isso seria traduzido em um ganho adicional de 8,5% na renda per capita. Os ganhos obtidos resultariam em quedas significativas das taxas de pobreza e de forma sustentável. Com a melhora nas condições econômicas, haveria também mais recursos para serem redistribuídos ao longo dos anos.
Fica evidente que o crescimento econômico derivado de ganhos de produtividade é um grande aliado do combate à pobreza, como tem sido em diversos países em desenvolvimento – mas não tanto no Brasil. Medidas como as defendidas pelo Unidos pelo Brasil devem, portanto, ser vistas não só como necessárias para uma maior pujança da economia, mas também como um caminho para retirar milhões de famílias brasileiras da situação atual de pobreza, sem possuírem uma renda suficiente para viver em condições dignas.