O temor de que um programa de renda mínima se torne bom cabo eleitoral para Bolsonaro nas eleições de 2022 não pode ser determinante para sua criação. Um bom programa de transferência de renda é interesse nacional. Tal temor reflete somente falta de liderança, de projeto de País e de uma narrativa capaz de conquistar a maioria do eleitorado.
É um erro grave tratar assuntos de interesse nacional com olhar eleitoral. A relutância em se aprovar um programa de renda mínima não pode ser ditada pela perspectiva de se tornar um bom cabo eleitoral para Bolsonaro nas eleições de 2022. Esse temor retrata um problema muito mais sério: a falta de liderança, de projeto de País e de uma narrativa convincente, capaz de conquistar a maioria do eleitorado – mais de 60% dos eleitores, segundo as últimas pesquisas – que busca uma alternativa viável ao presidente da República.
Aliás, a análise do atual cenário político revela o oposto. Bolsonaro terá dificuldade de se reeleger com tantas evidências de incompetência e desgoverno. Um governo que provou ser um desastre na condução da pandemia do Covid; um país que enfrenta a taxa de desemprego mais alta da sua história; uma nação dilacerada pela recessão econômica, desconfiança dos investidores, queda de renda da população e aumento da pobreza; um Brasil que se tornou pária nas relações internacionais. Qualquer analista isento diria que a oposição deveria vencer uma eleição presidencial nesse cenário.
O protagonismo dos partidos
O programa renda mínima só será um fator decisivo nas eleições de 2022 se a oposição continuar a ser uma sepultura de ideias, de liderança e de ação política. Por isso, ao invés de relutar em aprovar um programa importante para a população mais pobre, os partidos devem se empenhar para criar propostas, formar lideranças e construir narrativas para conquistar a maioria do eleitorado.
Os partidos terão um papel protagonista na construção de um programa factível de renda mínima.
Primeiro, a criação do Renda Mínima deveria seguir os aprendizados, erros e acertos do programa mais exitoso do País, o Bolsa Família. As duas maiores virtudes do Bolsa Família é ser um programa fiscalmente sustentável e vacinado contra intermediação política. O dinheiro chega diretamente às pessoas sem a interferência de governantes.
Segundo, é importante usar a oportunidade de se criar o programa de renda mínima para acabar com programas assistenciais mal formulados que representam alto custo financeiro e resultado duvidoso.
O Brasil precisa abandonar essa visão míope, que costuma mesclar interesse eleitoral e interesse nacional, e focar na resolução dos problemas estruturais. A virtude da política consiste justamente em pavimentar o caminho do consenso e do entendimento em torno do interesse nacional. Se todos os temas são tratados sob a ótica partidária e eleitoral, a política deixa de ser virtuosa e se transforma numa guerra santa.