Milhões de brasileiros sofrem sem acesso ao saneamento básico
O projeto de lei do Saneamento aprovado na Câmara dos Deputados é um marco importante da modernização do Estado. Ele endereça um problema vital que o Brasil precisa resolver com urgência: assegurar a universalização do saneamento básico.
Dados sobre o saneamento básico












Panorama sobre saneamento em 9 tópicos
Desde seu lançamento, VirtùNews trata do urgente combate à situação inaceitável do atendimento dos serviços de saneamento básico no Brasil por meio da boa informação e análise.
No decorrer de 2019 publicamos uma dezena de artigos e entrevistas que abordam o tema a partir de seus mais diversos aspectos, a começar pela realidade vergonhosa dos estados e municípios. Apresentamos o histórico e os múltiplos projetos de lei que antecederam o novo marco aprovado. Trouxemos os números da ineficiência estatal e das enormes oportunidades de investimento que a privatização do setor abre ao País. Detalhamos os pontos centrais do projeto, explicitamos seus benefícios para a renda, emprego, saúde, educação, turismo e habitação.
Saneamento diz respeito a todos os brasileiros. A primeira vitória, a articulação política necessária para sua implementação, foi conquistada. Permaneceremos atentos aos dois próximos desafios em direção à implementação do mesmo após a sanção presidencial: os processos de regulação e governança.
Entenda o que é saneamento básico, qual a situação atual no Brasil e qual o papel do marco regulatório, que propõe soluções por meio da concorrência e iniciativa privada.
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O que é saneamento básico?
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Qual a importância do saneamento básico?
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Quais doenças são causadas pela falta de saneamento básico?
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Saneamento é um direito humano?
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Saneamento básico no Brasil
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Quais são os desafios para melhorar o precário saneamento básico brasileiro?
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Existe uma lei de saneamento básico no Brasil?
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O marco regulatório do saneamento básico: um novo horizonte
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Quais os próximos passos para o saneamento básico no Brasil?
1. O que é saneamento básico
Acesso à água potável, esgoto coletado e tratado, ruas limpas, lixo triado e proteção contra enchentes nas cidades são fatores fundamentais para a saúde e qualidade de vida da população. No Brasil, essa realidade ainda não diz respeito a milhões de cidadãos que vivem em municípios onde o saneamento básico é precário e insuficiente.
Saneamento básico consiste em um conjunto de medidas e serviços fundamentais para a higiene, saúde e qualidade de vida da população. A distribuição de água potável e a coleta e tratamento de esgoto são as principais preocupações quando falamos em saneamento no Brasil.
A água que utilizamos para beber, cozinhar e tomar banho deve passar por um longo processo de captação e tratamento para chegar limpa e saudável às nossas casas. Já o tratamento de esgoto diz respeito ao sistema que purifica a água residual utilizada em residências, comércios e indústrias. Tratá-la é fundamental para evitar a proliferação de doenças e a contaminação da água potável consumida pela população.
O saneamento também envolve a limpeza das cidades, o manejo dos resíduos sólidos (separação e destinação adequada do lixo) e a drenagem urbana, responsável por manter os municípios seguros e livres de enchentes.
2. Qual a importância do saneamento básico?
De acordo com o Instituto Trata Brasil, os serviços de tratamento de água e esgoto reduzem a mortalidade, melhoram a qualidade de vida, ajudam a preservar o meio ambiente, expandem o turismo, valorizam os imóveis e, portanto, aquecem a economia.
O Instituto aponta que, em 20 anos (2016 – 2036), o avanço gradativo no saneamento poderá significar uma economia de R$ 5,9 bilhões aos cofres do País, considerando apenas o setor da saúde. Com menos doenças causadas pela falta tratamento de água e esgoto, o número de internações no Sistema Único de Saúde (SUS) deve diminuir, assim como os gastos com trabalhadores que precisam ser afastados.
Além disso, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cada real investido no acesso ao saneamento traz de 3 a 36 reais em retorno para as pessoas beneficiadas direta ou indiretamente. Saiba mais sobre o histórico do investimento em saneamento no Brasil.
3. Quais doenças são causadas pela falta de saneamento básico?
De acordo com a OMS, mais de 800 mil pessoas em países de baixa e média renda morrem em consequência da má qualidade da água, higiene inadequada e falta de saneamento todos os anos. A presença de agentes patógenos, como bactérias, vírus e protozoários, pode provocar infecções gastrointestinais potencialmente fatais. Além disso, cerca de 60% dos óbitos causados por diarreia estão relacionados a esses fatores, principalmente na infância. O rotavírus, por exemplo, é responsável por cerca de 40% das internações hospitalares em crianças menores de cinco anos no mundo.
Portanto, garantir níveis mínimos de saneamento pode fazer muito pela expectativa de vida de uma população. Doenças como diarreia, verminoses, hepatite A, dengue e leptospirose estão diretamente relacionadas à contaminação da água e à falta de saneamento básico.
4. Saneamento é um direito humano?
Em julho de 2010, a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou uma resolução que reconhece o acesso à água limpa e ao saneamento básico como direitos universais. A Assembleia pediu que organismos internacionais e os 192 Estados-Membros, incluindo o Brasil, oferecessem financiamento, tecnologia e outros recursos para ajudar os países a garantir o acesso gradativo à toda a população.
Mais tarde, em 2017, a ONU aprovou outra resolução que reconheceu o saneamento básico como um direito humano separado do direito à água potável, chamando atenção para mais de 2,5 bilhões de pessoas que vivem sem acesso a banheiros e sistemas de esgoto adequados no mundo.
As medidas, que devem ser adotadas pelos Estados e organizações, também estão previstas nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, que pretendem, entre outras medidas, “assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todas e todos” até 2030. O Brasil é signatário da chamada Agenda 2030 e, portanto, comprometeu-se a atingir a meta. Porém, de acordo com os dados mais recentes sobre saneamento básico, o País tem feito menos do que o suficiente para atingi-la.
5. Saneamento básico no Brasil
O acesso à água potável e à coleta de esgoto ainda é um privilégio no Brasil. Segundo dados de 2018 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), 16,4% da população ainda não tem acesso ao abastecimento de água — o que equivale a 35 milhões de pessoas, ou seja, o triplo da população de Portugal!
O abismo é ainda maior em relação ao tratamento de esgoto: somente 46% do volume coletado é devidamente tratado. Assim, aproximadamente 100 milhões de pessoas no Brasil não têm acesso — o dobro da população da Argentina.
6. Quais são os desafios para melhorar o precário saneamento básico brasileiro?
A coleta e o tratamento de esgoto, ainda precários, são os principais desafios enfrentados por todo o Brasil em saneamento básico.
Em relação apenas à coleta, as regiões Norte e Nordeste são as principais afetadas pela precariedade do sistema. Ananindeua, Belém, Manaus, Macapá e Porto Velho estão listados entre os municípios que possuem os 10 piores índices, segundo estudo feito pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a consultoria GO Associados. Veja quais são as piores cidades.
Por outro lado, municípios das regiões Sul e Sudeste apresentam os melhores índices de coleta de esgoto, atingindo quase 100%. O estado de São Paulo possui cinco cidades no Top 10: Piracicaba, Santos, Taubaté, Franca e Santo André. As outras cinco do ranking fincam no Paraná: Cascavel, Curitiba, Londrina, Maringá e Ponta Grossa.
Os desafios são ainda maiores em relação ao tratamento de esgoto. Quando não tratado, além de apresentar um risco para a saúde, polui córregos, rios, lagoas e praias, afetando o ecossistema e prejudicando a economia. Nesse caso, seis cidades do Sudeste apresentam os piores índices nacionais: Belford Roxo, Juiz de Fora, Bauru, Nova Iguaçu, Governador Valadares e São João de Meriti. Quatro municípios da região Norte também fazem parte do ranking de piores índices de tratamento: Santarém, Porto Velho, Belém e Ananindeua.
Considerando apenas as maiores cidades do Brasil, o índice de tratamento foi de 56,1% em 2018. O cenário é ainda pior em municípios menores: a média nacional foi de 43,3%. Ou seja, populações de cidades pequenas estão mais sujeitas a não ter o esgoto tratado.
Em contrapartida, os índices de acesso à água tratada são maiores: 93,3% da população tinha acesso em 2018 nas 100 maiores cidades brasileira. Mais uma vez, a média dos grandes municípios foi maior do que a média geral do Brasil: 83,6%.
7. Existe uma lei de saneamento básico no Brasil?
A Lei nº 11.445/07, de 2007, estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico no Brasil. Ela define serviços e infraestruturas tanto para o abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto, quanto para a limpeza urbana, o manejo de resíduos sólidos e a drenagem de águas pluviais urbanas.
Mais tarde, em 2013, o governo Dilma anunciou o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), com o objetivo de tirar o atraso e universalizar o acesso à água e ao esgoto no Brasil até 2033. No entanto, a nova legislação também foi insuficiente, tomando como argumento a falta de dinheiro de governos para cumprir as metas estabelecidas.
8. O marco regulatório do saneamento básico: um novo horizonte
Para solucionar a falta de investimento público no saneamento básico, o Congresso Nacional discute desde 2018 o marco regulatório do saneamento básico, que poderá ampliar a participação do setor privado. A proposta prevê a universalização do saneamento, estabelecendo como metas a coleta de esgoto para 90% da população e o fornecimento de água potável para 99% até 2033.
Para atingir as metas, a nova legislação tem três pontos principais:
a) Privatizações e concessões públicas
O principal ponto da nova legislação é a abertura de investimentos para a concorrência privada, retirando o privilégio das empresas estatais, como a Sabesp e a Cedae, que hoje controlam 70% do mercado.
Assim, os responsáveis pela prestação do serviço poderão fazer concessões públicas à iniciativa privada por meio de licitações. Portanto, quem oferecer as melhores condições para os serviços de saneamento básico, como qualidade da água e valor das tarifas, vence a concorrência. Saiba mais sobre o mercado do saneamento no Brasil hoje.
b) O papel da Agência Nacional de Águas
Outro ponto importante da proposta é o papel da Agência Nacional de Águas (ANA), órgão regulador federal que ficará responsável pela regulação do saneamento básico de forma centralizada e uniformizada. A ANA deverá estabelecer as principais normas de referência sobre padrões de qualidade, eficiência, tarifas, contratos e redução do desperdício, assim como verificar o cumprimento das metas. As empresas que tiverem fora do padrão poderão sofrer sanções.
c) Alterações na governança: blocos regionalizados de municípios
Por fim, o projeto define que municípios e o Distrito Federal serão responsáveis pelos serviços públicos de saneamento básico em âmbito local, estabelecendo planos, metas, direitos, deveres e informando os usuários sobre a prestação do serviço.
Consórcios públicos e convênios de cooperação entre vizinhos poderão ser criados para garantir a prestação do serviço em determinada região. A proposta prevê, ainda, o estabelecimento de blocos regionalizados de municípios — ou seja, grupos de cidades que poderão contratar os serviços em conjunto, integrando a mesma licitação. O objetivo é aumentar as chances de investimento privado para municípios que teriam menos chances de obter bons contratos de forma independente.
9. Quais os próximos passos para o saneamento básico no Brasil?
O marco legal foi aprovado pela Câmara dos Deputados em dezembro do ano passado. No dia 24 de junho, foi aprovado pelo Senado por 65 votos a 13. Agora, segue para a sanção do presidente Jair Bolsonaro, que tem 15 dias úteis para sancionar ou vetar o projeto.
Se sancionado pelo presidente, os contratos vigentes deverão se comprometer com as metas de universalização de saneamento até 2033. Os contratos que já estão em vigor poderão ser mantidos e, até março de 2022, poderão ser prorrogados por 30 anos. Mas para isso, devem comprovar viabilidade econômico-financeira, ou seja, devem ser capazes de se manter por conta própria pela cobrança de tarifas e contratação de dívidas.
O projeto também altera os prazos da Política Nacional de Resíduos Sólidos para que os municípios encerrem os lixões a céu aberto, estendendo-os para 2021 no caso de capitais e regiões metropolitanas, e 2024 para cidades com menos de 50 mil habitantes.
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