Manter o teto de gastos, retomar os superávits primários e destravar reformas são medidas urgentes para evitar o colapso financeiro, a inflação e contribuir para a retomada do crescimento econômico e da geração de emprego. Mas é preciso ação. O abismo está próximo.
O Brasil está sambando à beira do penhasco. Sem um plano coerente para acelerar a aprovação de reformas e reequilibrar as contas públicas, o país terá um encontro marcado com uma nova crise econômica e social.
Jair Bolsonaro, de olho na reeleição, não exerce a liderança das reformas. Reformismo nunca foi atributo seu. O Congresso, por sua vez, parece ter como prioridade a sucessão das presidências na Câmara e no Senado, e não aprovar os projetos de interesse do País. Nesse ritmo, o governo terá dificuldades crescentes para pagar suas despesas, e a inflação, que já começa a furar a meta, poderá ganhar ainda mais força.
As projeções do rombo nas contas públicas são alarmantes: o déficit primário (excluindo os gastos com os juros da dívida pública) ficará ao redor de R$ 800 bilhões. Isso equivale a 10% do PIB brasileiro. Não por outro motivo, o endividamento do governo está em uma escala ascendente e poderá em breve atingir 100% do PIB.
.Enquanto isso, em Brasília discutem-se alegremente brechas para criar despesas. Pouco, muito pouco se fala de como fazer o governo caber dentro do PIB brasileiro.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, fez o alerta: o País “pode ir muito rápido para a hiperinflação” caso nada seja feito. A hiperinflação, como a vivida pelos brasileiros não faz muito tempo, representa a falência da moeda, uma consequência inevitável quando há o descalabro nas finanças do governo.
Guedes, no entanto, joga para o Congresso a culpa pela inação, quando, na verdade, a liderança deveria partir do Executivo. Pouco adiantará lançar ameaças hiperbólicas se o próprio governo não fizer sua parte, apresentando um plano crível e liderando a coordenação política para levá-lo adiante.
Três ações urgentes
São necessárias três ações urgentes para que o governo possa evitar o colapso financeiro e contribuir decisivamente para a retomada do crescimento econômico e da geração de emprego.
1.Manter o teto de gastos
A regra de impedir que o governo aumente os gastos para além dos níveis de anos anteriores é essencial para manter o que resta da credibilidade na gestão das contas públicas. Até que uma nova âncora fiscal seja aprovada, ele precisa ser mantido, porque, do contrário, a dívida pública crescerá ainda mais rapidamente. O Brasil ficaria a um passo do colapso fiscal.
Manter o teto de gastos significa preservar seus princípios, e não criar brechas que possam arruinar completamente sua eficácia como âncora para o equilíbrio das finanças públicas.
2.Retomar os superávits primários
Manter o teto é o mínimo necessário. O ideal, na verdade, é possuir uma âncora fiscal mais robusta, como o País já teve no passado. Essa âncora é o superávit fiscal primário (saldo positivo entre receitas e despesas, excluindo os juros da dívida). Em outras palavras, o governo precisa voltar a manter os seus gastos abaixo de suas receitas.
Os números recentes são alarmantes. Desde 2014, o país não registra superávits primários. De acordo com as projeções mais recentes do governo, na atual trajetória as contas voltarão ao azul apenas em 2027 – e isso, claro, se não houver novas surpresas negativas no meio do caminho. É tempo demais. O Brasil quebra antes disso. Para o Instituto Fiscal Independente, os resultados continuarão negativos até pelo menos 2030.
Rombo fiscal vira dívida, e o aumento do endividamento empurra para cima os juros. Apesar de a taxa básica (Selic) estar em um nível historicamente baixo, de 2% ao ano, as taxas de mercado estão em alta e já passam de 8% para os títulos com vencimento em 2030. Isso significa que o custo do capital para o financiamento de investimentos produtivos tenderá a ficar mais alto, inibindo o crescimento do PIB.
3.Destravar reformas
Sem reformas, o país estará condenado a um futuro medíocre, de crises seguidas e baixo crescimento. A lista do que fazer é extensa.
A reforma da Previdência, depois de um ano de aprovada, ainda segue incompleta. A reforma administrativa começou a tramitar, mas ainda de maneira lenta. A reforma tributária está travada no Congresso, e o governo, em vez de contribuir com os bons projetos que já estavam em discussão, apresentou um novo que apenas trouxe mais confusão. Sem falar na ideia anacrônica de ressuscitar a famigerada CPMF.
As reformas são essenciais não apenas para fortalecer as finanças do governo, mas também para aumentar a produtividade tanto do setor público como do setor privado.
Sem essas três ações urgentes, o Brasil terá dias difíceis à frente. Há quem ache que tudo isso não passe de terrorismo do mercado financeiro. Antes fosse. O dólar disparou, com impacto na inflação. A incerteza inibe investimentos e retarda a retomada econômica. Enquanto isso, o desemprego começou a crescer com força e atinge 14% dos trabalhadores. Estima-se que poderá alcançar o pico de 20% nos próximos meses, como resultado da reabertura da economia e aumento do número de pessoas procurar uma vaga de trabalho.
Ainda há tempo para evitar o pior. O grande risco será se o governo e o Congresso colocarem os seus interesses em primeiro lugar e não agirem rapidamente para reverter o cenário turbulento que vai se formando no horizonte.